Produto que apresenta defeito após um ano de uso ainda está na garantia?
O Código de Defesa do Consumidor não estipula um prazo máximo para o consumidor reclamar por vícios ocultos perante o fornecedor. Na falta de uma disposição expressa, os Tribunais adotaram o critério da vida útil do bem, como prazo para reclamar por vícios ocultos.
Qual o prazo de garantia de um produto
De acordo com o Código de Defesa do Consumidor (CDC) o prazo de garantia legal é de:
– 30 dias para produtos não-duráveis (alimentos, produtos de higiene, medicamentos etc);
– 90 dias para produtos duráveis (eletrodomésticos, móveis, veículos etc).
Transcorrido o prazo de garantia, o consumidor perde o direito de reclamar sobre vícios – popularmente chamados de defeitos – apresentados no produto ou no serviço adquirido.
Quando começa a contar o prazo de garantia
O direito de reclamar por vícios do produto deixa de existir após escoado o prazo da garantia legal.
Para produtos duráveis, este prazo é de 90 dias e deve ser contado a partir da entrega efetiva do produto ao consumidor – no caso de vícios aparentes ou de fácil constatação.
Quanto a vícios ocultos, o prazo de garantia inicia a partir do momento em que ficar evidenciado o defeito.
Saiba mais sobre vícios
“Vícios” são características de qualidade ou quantidade que tornam os produtos ou serviços impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou que lhes diminuam o valor.
Também são considerados vícios a disparidade em relação às indicações constantes do recipiente, embalagem, rotulagem, oferta ou mensagem publicitária.
Se o produto não funciona adequadamente ou está amassado, tem arranhões, manchas, quebraduras, o produto tem um vício de qualidade.
Se o produto não está de acordo com informações ou especificações, pesando menos, faltando folhas, com menor metragem, o produto tem um vício de quantidade.
O que é vício oculto
Vício oculto é aquele que só aparece algum ou muito tempo após o uso do produto e que não é de fácil constatação, como no caso do sistema de ar-condicionado do automóvel zero quilômetro que passa a apresentar mau funcionamento, ou do freezer que deixa de congelar alimentos ou apresenta vazamento de água.
Pode acontecer que o produto apresente vício após longo tempo da compra. Mesmo assim, conforme o CDC, o prazo de garantia do produto (de 90 dias para produtos duráveis), começa a fluir, obrigando o fornecedor a sanar o vício – efetuar os reparos – no prazo de 30 dias.
Por quanto tempo posso reclamar por vícios ocultos
O Código de Defesa do Consumidor não estipula um prazo máximo para o consumidor reclamar por vícios ocultos perante o fornecedor.
Na falta de uma disposição expressa, os Tribunais adotaram o critério da vida útil do bem, como prazo para reclamar por vícios ocultos.
Os bens de consumo, sobretudo os bens duráveis, possuem uma longevidade previsível, criando a expectativa no consumidor quanto à sua durabilidade.
Assim, se determinado bem tem vida útil de 3 anos, apresentando vicio no segundo ano, a partir da constatação do vício, começa a correr o prazo de garantia que obriga o fornecedor ao reparo do bem.
Leia também
+ O que fazer quando produto apresenta defeito mais de uma vez
+ Concessionária e fabricante terão que substituir veículo
+ Quem mora de favor pode pedir usucapião?
Jurisprudência: vício do produto
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REDIBITÓRIA C/C COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO NOVO (“ZERO QUILÔMETRO”) COM VÍCIO OCULTO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚM. 07/STJ. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚM. 211/STJ. JULGAMENTO FORA DO PEDIDO. INEXISTÊNCIA. SUBSTITUIÇÃO DO PRODUTO OU RESTITUIÇÃO DA QUANTIA PAGA. GARANTIA LEGAL. CRITÉRIO DA VIDA ÚTIL DO BEM. GARANTIA CONTRATUAL OFERECIDA PELO FABRICANTE. VINCULAÇÃO DO COMERCIANTE. RECLAMAÇÃO DIRECIONADA A QUALQUER DOS FORNECEDORES. ATO QUE OBSTA A DECADÊNCIA. PRAZO PARA SANAR O VÍCIO. DIREITO DO FORNECEDOR. RECLAMAÇÃO PELO MESMO VÍCIO. AUSÊNCIA DE SUSPENSÃO OU INTERRUPÇÃO DO TRINTÍDEO. VÍCIO INTEGRALMENTE SANADO FORA DO PRAZO LEGAL. TOLERÂNCIA DO CONSUMIDOR. RENÚNCIA AO DIREITO DE RECLAMAR NÃO CONFIGURADA. PRETENSÃO DO CONSUMIDOR EXERCIDA FORA DO PRAZO LEGAL. DECADÊNCIA DO DIREITO. JULGAMENTO: CPC/73.
1. Ação redibitória c/c compensação por dano moral ajuizada em 16/08/2010, da qual foram extraídos os presentes recursos especiais, interpostos em 27/05/2014 e 05/06/2014, atribuídos ao gabinete em 25/08/2016.
2. O propósito dos recursos especiais consiste em decidir sobre: (i) o julgamento fora do pedido; (ii) o prazo de eficácia da garantia legal por vício oculto do produto; (iii) o alcance da garantia contratual; (iv) o efeito obstativo do prazo decadencial da reclamação apresentada pelo consumidor perante terceiro; (v) o prazo para o fornecedor sanar o vício do produto e a renúncia do consumidor ao direito de reclamar; e (vi) a mora na restituição da quantia paga.
3. O reexame de fatos e provas em recurso especial é inadmissível.
4. A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados impede o conhecimento do recurso especial.
5. Se a demanda é decidida nos contornos da lide, que são estabelecidos a partir do exame da causa de pedir e dos limites do pedido veiculado em sua petição inicial, não há falar em julgamento fora do pedido.
6. Há de ser diferenciado o prazo pelo qual fica o fornecedor obrigado a assegurar a adequação do produto com relação aos vícios ocultos, do prazo decadencial durante o qual o consumidor pode exercer o direito de reclamar, com fulcro no art. 18, § 1º, do CDC.
Enquanto o primeiro limita a responsabilidade do fornecedor; o segundo limita o direito de o consumidor exigir a substituição do produto, a restituição imediata da quantia paga, ou o abatimento proporcional do preço. 7. Na ausência de expressa disposição legal sobre o prazo que vincula o fornecedor à garantia contra vícios ocultos, adotou-se como baliza a vida útil do bem, pois, se os bens de consumo trazem em si uma longevidade previsível, criam, no consumidor, a legítima expectativa quanto à sua durabilidade adequada.
8. A regra extraída do art. 50 do CDC, a partir de uma interpretação teleológica e sistemática da lei consumerista, é a da não sobreposição das garantias legal e contratual.
9. A garantia contratual, enquanto ato de mera liberalidade do fornecedor, implica o reconhecimento de um prazo mínimo de vida útil do bem, de modo que, se o vício oculto se revela neste período, surge para o consumidor a faculdade de acioná-la, segundo os termos do contrato, sem que contra ele corra o prazo decadencial do art. 26 do CDC; ou de exercer seu direito à garantia legal, com base no art.
18, § 1º, do CDC, no prazo do art. 26 do CDC. 10. A garantia estabelecida pelo fabricante, porque se agrega ao produto como fator de valorização e, assim, interfere positivamente na tomada de decisão do consumidor pela compra, vincula também o comerciante, que dela se vale para favorecer a concretização da venda. 12. Ademais, o art. 18 do CDC, ao impor a responsabilidade solidária da cadeia de fornecedores, confere ao consumidor a possibilidade de demandar qualquer deles, indistintamente, pelo vício do produto, de modo que, surgindo o vício durante a garantia contratual oferecida pelo fabricante, pode o consumidor exercer o direito de reclamar contra o comerciante.
13. A regra do art. 18 do CDC induz à conclusão de que a reclamação direcionada a qualquer dos fornecedores é ato capaz de obstar o prazo decadencial previsto no art. 26 em face de toda a cadeia, porque é a demonstração inequívoca da intenção do consumidor de ver sanado o vício, sob pena de exercer seu direito de exigir a adoção das medidas previstas no § 1º daquele dispositivo legal. 14. De acordo com o CDC, tem o fornecedor o direito de, no prazo máximo de 30 dias, sanar o vício apresentado no produto (primeiro nível de proteção), contado esse lapso, sem interrupção ou suspensão, desde a primeira manifestação do vício até o seu efetivo reparo.
15. A tolerância do consumidor, que crê e aguarda a solução do problema, mesmo depois de ultrapassado o prazo legal concedido ao fornecedor, para assim tentar preservar o negócio jurídico tal qual celebrado, não deve, em princípio, ser interpretada como renúncia ao seu direito de reclamar, inclusive porque, até que receba uma resposta inequívoca, não corre contra ele o respectivo prazo decadencial (art. 26, § 3º, do CDC).
16. Mesmo depois de integralmente sanado o vício, é possível que persista o interesse na substituição do produto, na restituição imediata da quantia paga ou no abatimento proporcional do preço, se, em razão da extensão do vício, a troca das partes viciadas comprometer a qualidade ou as características do produto, diminuir-lhe o valor ou se se tratar de produto essencial.
17. No particular, sanado o vício pelo fornecedor, depois de transcorrido o trintídio legal, o consumidor exerceu a pretensão de exigir a substituição do veículo ou a restituição da quantia paga quando já escoado o prazo de 90 dias previsto no art. 26, II, do CDC, sendo forçoso pronunciar a decadência do seu direito.
18. Recursos especiais parcialmente conhecidos e, nessa extensão, providos.
(REsp 1734541/SE, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/11/2018, DJe 22/11/2018)
Doutrina
“A abertura do termo inicial para contagem do prazo dos vícios ocultos não significa, todavia, que a garantia legal seja eterna. Segundo ensina Claudia Lima Marques, a extensão desta garantia, em relação aos vícios ocultos, será determinada em razão da sua durabilidade, ou seja, da vida útil de um determinado produto. Neste sentido, só haverá garantia durante a vida útil do produto, enfraquecendo esta garantia com a passagem do tempo e consequente diminuição deste período de utilidade. A determinação de qual seja este período, contudo, será tarefa do juiz ao examinar o caso, em vista das características técnicas e a expectativa de utilização razoável de um produto, ou fruição de um serviço.” (Curso de Direito do Consumidor. 4ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p. 593 – sem grifo no original)
“Sem prejuízo, naturalmente, de que o prazo de garantia legal possa ser estendido em face da natureza do vício do produto ou do serviço. Se a hipótese for de vício oculto, a contagem do prazo, em atenção ao que dispõe o § 3º do artigo 26, terá seu termo inicial no momento em que se evidenciar o vício, vinculando-se o tempo da eficácia da garantia ao critério da vida útil do produto ou do serviço em questão.” (MIRAGEM, Bruno. Curso de Direito do Consumidor. 4ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p. 597 – sem grifos no original).