Usucapião familiar ou por abandono do lar

Usucapião familiar ou por abandono do lar

A usucapião por abandono do lar ou usucapião familiar é uma das formas de aquisição da propriedade imobiliária, sendo necessário, dentre outros requisitos, o exercício da posse mansa e pacífica pelo cônjuge que foi abandonado por um prazo de 2 anos ininterruptos.

Apesar dessa modalidade de usucapião ter sido introduzida no Código Civil já no ano de 2011, ainda existem dúvidas quanto aos requisitos necessários para sua aplicação.

A usucapião familiar não é uma penalidade ao cônjuge que abandonou o lar

Inicialmente, a usucapião familiar não constitui uma penalidade ao cônjuge que abandonou o lar.

A redação da Emenda Constitucional nº 66/2010, parágrafo 6º, que alterou o artigo 226 da Constituição, dispõe que o divórcio dissolve o casamento, não sendo mais necessário se discutir sobre a culpa do cônjuge pelo rompimento do casal.

Assim, a usucapião por abandono do lar consiste apenas em uma proteção ao ex-cônjuge ou ex-companheiro que teve que arcar com pagamento de tributos e demais despesas advindas do imóvel.

A usucapião por abandono do lar visa, sobretudo, salvaguardar o direito à moradia do ex-cônjuge que permaneceu no imóvel, protegendo a família do abandono.

Requisitos para a ação de usucapião por abandono do lar

Dispõe o art. 1.240-A, do Código Civil:

Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

Para ingressar com a ação de usucapião por abandono do lar familiar, devem estar presentes os seguintes requisitos:

(i) posse mansa, pacífica, ininterrupta pelo prazo de 2 anos, sem qualquer contestação pelo ex-cônjuge ou ex-companheiro que tenha abandonado o lar;

(ii) o imóvel não poderá ultrapassar 250m² de área total tendo o seu uso para moradia do ex-cônjuge ou ex-companheiro ou da família;

(iii) ter o possuidor o ânimo de proprietário, agindo como verdadeiro dono, sem qualquer dependência ou subordinação ao ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar;

(iv) não ser proprietário de outro imóvel urbano ou rural;

(v) o possuidor exercer este direito uma única vez;

(vi) a aquisição do imóvel deve se dar na constância do casamento ou da união estável.

Quem pode ingressar com a ação de usucapião por abandono do lar

Pode ingressar com a ação de usucapião por abandono do lar o ex-cônjuge ou ex-companheiro que permaneceu no imóvel após a separação de fato.

O casamento ou a convivência em união estável é requisito para pleitear a propriedade do imóvel frente ao Poder Judiciário.

O Código Civil não faz qualquer distinção quanto à união de pessoas do mesmo sexo, protegendo todas as entidades familiares.

Uso do imóvel para moradia do ex-cônjuge, ex-companheiro ou da família

Além da posse ininterrupta por 2 anos, o interessado deve usar o bem para sua moradia e de sua família.

Caso antes do prazo de 2 anos, deixe o imóvel fechado ou o alugue, não poderá adquirir a propriedade exclusiva do bem pela usucapião familiar.

Conforme a lei, a “posse direta e ininterrupta” é requisito indispensável para aquisição da propriedade.

Não pode, igualmente, no período aquisitivo de 2 anos, haver oposição do ex-cônjuge ou do ex-companheiro.

Qualquer medida judicial ou extrajudicial que demonstre interesse pelo imóvel por parte do ex-parceiro, afasta o direito à usucapião familiar.

Copropriedade do bem imóvel

Outro destaque que é preciso dar é que a usucapião exige a copropriedade do imóvel.

De acordo com o Código Civil, a propriedade deve estar dividida, ou seja, deve pertencer a ambos os ex-conviventes, o que geralmente importa em ter sido o bem adquirido durante o relacionamento.

Caso o bem pertença exclusivamente ao cônjuge ou ao companheiro que abandonou o lar, não se aplica o usucapião por abandono do lar.

Nesse caso, pode-se pensar em outra espécie de usucapião com prazo de posse de no mínimo 5 anos.

Abandono voluntário

O abandono do lar deve ser voluntário pelo ex-cônjuge ou ex- companheiro.

No caso do ex-cônjuge que abandonou o lar prestar assistência material à família ou pagar tributos sobre o imóvel, não restará caracterizado o abandono.

Não é bastante a simples “separação de fato”.

É imprescindível que o ex-cônjuge ou ex-companheiro tenha abandonado o imóvel e a família.

Esse é o entendimento preponderante da doutrina: sem o abandono simultâneo do imóvel e da família não se configura o abandono do lar para efeito de usucapião.

O simples afastamento do lar, com o cumprimento dos deveres de assistência material e imaterial, não enseja à usucapião.

Se o ex-cônjuge ou ex-companheiro continua a exercer seu dever de cuidado com a família, pagando alimentos, mantendo convivência com filhos e contribuindo com a liquidação de tributos relativos ao imóvel, isso demonstra que mantém o interesse tanto pelo imóvel, como pela família.

Outras espécies de usucapião

A ação de usucapião tem largo emprego na regularização da propriedade imobiliária, fazendo com que o posseiro obtenha a declaração do domínio pleno sobre o imóvel podendo, assim, registrá-lo em seu nome no Cartório de Registro de Imóveis, como no caso de terrenos, lotes urbanos, rurais, apartamentos etc.  

Por fim, existem várias modalidades de usucapião, sendo também possível, por seu intermédio, a aquisição da propriedade de bens moveis, como no caso da usucapião de veículos.

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Por Emerson Souza Gomes

Advogado, sócio do escritório Gomes Advogados Associados, www.gomesadvogadosassociados.com.br.

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