Emprestei um imóvel e a pessoa não quer mais sair. O que fazer?
Emprestei um imóvel e a pessoa não quer mais sair. O que fazer?
Quando alguém empresta um imóvel a outra pessoa para a sua moradia – algo bastante comum em relações familiares – resta configurado um contrato de comodato.
O comodato é um empréstimo gratuito de coisas não fungíveis, como um terreno, uma casa, uma chácara etc.
Não é necessário um contrato escrito para a caracterização do comodato, pois a lei permite que o contrato se dê verbalmente entre as partes.
Os tribunais, inclusive, entendem que o mero consentimento, ou seja, um simples “deixar morar” do proprietário, já configura o comodato.
Para entender melhor como funciona o contrato de comodato, e saber quais cuidados tomar, acesse o post Quero alguém para cuidar de uma casa de graça: faço um comodato?
Negativa em sair do imóvel
Não é incomum ocorrer do comodatário, no momento em que o proprietário tem interesse em reaver a posse do que é seu, não concordar com a desocupação do imóvel.
Nessas ocasiões pode surgir a alegação de usucapião, ou seja, de que, em função do decurso do tempo, o comodatário adquiriu a propriedade do bem. Situações como essas merecem medidas rigorosas do proprietário!
Para saber quando a posse de um imóvel não dá direito à usucapião, acesse o post Usucapião: requisitos e documentos necessários.
Como recuperar o imóvel emprestado
Um primeiro passo é o proprietário notificar formalmente o comodatário para que desocupe o imóvel.
Na notificação, o proprietário deve exigir a desocupação do imóvel em um prazo razoável, inclusive, informando o comodatário que a recusa importará na adoção de medidas judicais e na cobrança de aluguel.
Leia o post do blog Como e por que fazer uma notificação extrajudicial para ficar por dentro de como proceder.
Tão logo seja feita a notificação, o proprietário deve providenciar a lavratura de boletim de ocorrência frente a autoridade policial.
No boletim, deve ficar registrada a negativa do comodatário em sair do imóvel.
O registro do boletim de ocorrência e a notificação formal do comodatário são duas medidas que aconselhamos.
Caso o comodatário não desocupe o imóvel, ignorando a notificação, o proprietário deve ingressar imediatamente com ação no Poder Judiciário pedindo a reintegração da posse do imóvel.
+ Herdeiros podem retomar imóvel de quem mora de favor
Reintegração da posse
Conforme o art. 1.210, do Código Civil, o possuidor tem direito à restituição na posse do bem no caso de esbulho:
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
Código Civil
Com a negativa em desocupar o imóvel, resta configurado o esbulho possessório por parte do comodatário.
Assim, o proprietário estará autorizado a ingressar com ação judicial para restituição da posse e, por conseguinte, obter um ordem judicial para que o comodatário desocupe o imóvel.
Para saber mais como proceder no caso de esbulho possessório, acesse o post Invadiram o meu terreno: o que fazer?
Liminar para desocupação do imóvel
Ações judiciais costumam demorar na Justiça.
Ao ingressar com a ação de reintegração de posse, o comodante – proprietário do imóvel – poderá pedir ao juiz uma medida liminar para que o comodatário desocupe o imóvel imediatamente, não sendo assim necessário aguardar pela sentença.
Para deferimento da tutela possessória, o comodante deverá provar:
– a sua posse;
– o esbulho praticado pelo réu;
– a data do esbulho;
– a perda da posse:
Direito à percepção de aluguéis e indenização
Além do direito de ser reintegrado na posse, com a notificação ocorre a constituição em mora do comodatário.
Assim, o proprietário passa a ter direito à indenização pelo uso sem autorização do imóvel, podendo exigir uma quantia a título de aluguel, além de poder cobrar outros prejuízos.
IMPORTANTE: na notificação deve o proprietário prevenir o comodatário quanto ao dever de pagar aluguéis caso não desocupe amigavelmente o imóvel, bem como, de que deverá indenizar eventuais prejuízos.
A alegação de usucapião
Um erro comum do proprietário, que dá margem a discussões judiciais, é não tomar providências imediatas para ser reintegrado na posse do imóvel.
Como mencionado acima, tão logo haja a negativa do comodatário em realizar a desocupação, o proprietário deve tomar medidas judiciais.
Existe uma presunção de que a causa e as qualidades da posse continuam a ser as mesmas da sua aquisição, ou seja, se alguém tem a posse de um imóvel em virtude de um comodato, ainda que passado anos, não pode vir a alegar a aquisição da propriedade pela usucapião.
IMPORTANTE! o “caráter” da posse – a causa da sua aquisição – pode sofrer alteração ao longo do tempo!
Conforme o art. 1.203, do Código Civil, “Salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o mesmo caráter com que foi adquirida.”
Caso o comodatário efetue prova eloquente, há a possiblidade de se reconhecer a alteração do caráter possessório em dado momento, passando a contar o tempo para a usucapião.
Para que haja alteração do caráter da posse, o comodatário deverá provar que se opôs ao direito do proprietário, na sua presença ou com o seu consentimento.
Um exemplo que leva a crer a alteração do caráter da posse, é o possuidor impedir o proprietário de adentrar o imóvel alegando se tratar de propriedade particular e exclusiva ou ignorando a notificação para desocupar o imóvel sem que o proprietário tome qualquer providência.
Daí a importância de, tão logo realizada a notificação, o proprietário ingressar com medida judicial.
Caso não ingresse com pedido judicial para desocupação do imóvel, corre o risco de fortalecer uma eventual alegação de usucapião.
Temos um post no blog que trata bem do assunto, acesse Quem mora de favor pode pedir usucapião?
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