Saiba quais os efeitos da posse: interditos (ações possessórias), frutos, retenção por benfeitorias, responsabilidade por deteriorações, usucapião, prova, uso e gozo da posse.
1. Quais são os efeitos da posse
Os efeitos da posse são as consequências jurídicas por ela produzidas. São elas:
– Uso dos interditos possessórios (ações possessórias);
– direito à percepção de frutos;
– Indenização das benfeitorias;
– responsabilidade por deterioração ou perda da coisa;
– direito à usucapião;
– distribuição do ônus da prova em favor do possuidor;
– posição mais favorável para defesa do direito de propriedade.
2. Efeitos da posse: direito ao uso dos interditos possessórios (ações possessórias)
Um dos efeitos da posse é o direito do possuidor ao uso de interditos possessórios, isto é, o recurso ao judiciário através de ações possessórias.
As ações possessórias têm por objetivo assegurar a posse de uma coisa, promovendo a sua defesa jurídica, estando previstas no Código Civil, no art. 1.210 e no Código de Processo Civil, nos arts. 554 a 568.
O possuidor tem o poder de invocar os interditos possesssórios quando se ver ameaçado, molestado ou esbulhado em sua posse, portanto, para repelir agressões e continuar na posse do bem.
2.1 Ação de manutenção de posse
A ação de manutenção de posse é o meio que o possuidor utiliza para manter a sua posse no caso de sofrer turbação, ou seja, quando sofrer algum ato que prejudique o livre exercício da posse, independentemente de haver, ou não, um dano, ter, ou não, o turbador melhor direito sobre a coisa.
Na turbação, o possuidor sofre embaraço no exercício da sua posse, contudo sem que venha a perdê-la. Vejamos o que diz o Código Civil:
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
Código Civil
2.1.1 Classificação da turbação
A turbação pode ser de fato ou de direito, sendo que, quando há agressão direta contra a posse, como no rompimento de cercas ou abertura de picadas, diz-se ocorrer uma turbação de fato.
Já a turbação de direito ocorre em um processo judicial, quando o réu contesta a posse do possuidor, ou, até mesmo, pela via administrativa, quando, por exemplo, houver decisão das autoridades, fixando largura a uma estrada, em detrimento da utilização da coisa.
Pode ainda a turbação ser direta ou indireta. A turbação direta é aquela que se exerce imediatamente sobre o bem que é o objeto da posse, como no caso do réu abrir um caminho no terreno do possuidor.
Por sua vez, a turbação indireta consiste em um ato nocivo à posse, mas que não necessariamente incide sobre a coisa. Pode-se citar como exemplo, o possuidor não conseguir alugar o seu imóvel em razão de boatos espalhados pelo turbador.
Por fim, a turbação pode consistir de atos positivos ou negativos. Atos turbativos positivos são aqueles que representam o exercício da posse sobre a coisa por parte do turbador, como o corte de árvores ou implantação de marcos. De outra parte, atos turbativos negativos, são os que, indiretamente, impedem o possuidor de praticar atos, dificultando o exercício da posse.
2.1.2 Requisitos da ação de manutenção de posse
De acordo com o Código de Processo Civil (art. 561), na ação de manutenção de posse, o possuidor deverá provar (i) a sua posse; (ii) a turbação; (iii) a data da turbação; e (iv) a continuação da posse, embora turbada.
2.2 Ação de reintegração de posse
A ação de reintegração de posse é cabível quando o possuidor sofre esbulho, tendo como objetivo a recuperação da posse perdida injustamente.
Entende-se como esbulho todo ato que despoja o possuidor da posse da coisa em razão de um ato violento, clandestino ou precário, ou seja, de um ato injusto.
São exemplos de esbulho, o comodatário não entregar a coisa dada em comodato findo o prazo contratual, ou o empregado, após a rescisão do contrato de trabalho, não restituir a casa que recebera para morar em função da relação de emprego.
O art. 1.212 do Código Civil prevê que o possuidor pode ingressar com a ação de manutenção de posse não só contra o esbulhador, mas também contra o terceiro que recebeu a coisa esbulhada, desde que este tenha conhecimento do esbulho.
É importante frisar que, de acordo com o art. 1.210, §2º, do Código Civil, a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa, não impede a manutenção ou a reintegração da posse, logo, o julgamento da posse não pode sofrer interferência pela invocação do direito de propriedade.
Para ficar claro, não se deve levar em conta o argumento do esbulhador ser proprietário da coisa, porque, ainda que dono da coisa, não lhe assiste o direito de molestar o exercício justo de uma posse ainda que por terceiro.
2.2.1 Defesa da posse: exceção de domínio
É possível a exceção de domínio quando as partes não conseguem provar de forma razoável a sua posse. Nesse sentido é o teor da Súmula 487 do Supremo Tribunal Federal:
Será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio, se com base neste for ela disputada.
Súmula 487, Supremo Tribunal Federal
A exceção do domínio somente é aplicável quando houver dúvida sobre a qualidade da posse do autor e do réu, ou quando ambas as partes justificarem suas respectivas posses no domínio. A posse, nestes casos, caberá a quem tiver o melhor título, ou seja, a quem for proprietário da coisa.
A decisão, no entanto, não fará coisa julgada no juízo petitório. Caso haja equívoco na atribuição da propriedade, poderá o prejudicado ingressar com ação, já que cabe ao proprietário do bem defender seu domínio contra quem, injustamente, o possua mediante ação de reivindicação.
2.2.2 Autotutela da posse
O art. 1.210, §1º, do Código Civil dispõe que o possuidor turbado ou esbulhado pode restituir à posse do bem por meio do desforço imediato. O dispositivo prevê um exemplo de autotutela de direito, consistente na legítima defesa.
Para que o possuidor possa fazer justiça com as próprias mãos, deverá agir pessoalmente, assumindo toda a responsabilidade, embora possa ter o auxílio de terceiros. Deverá, igualmente, agir de imediato e utilizar a força necessária para defender a sua posse, sem exageros, sob pena de responder pelo excesso.
2.3 Interdito proibitório
O interdito proibitório é a proteção preventiva da posse ante a ameaça de turbação ou esbulho, sendo previsto na segunda parte, do art. 1.210 do Código Civil:
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
Código Civil
Havendo justo receio, tanto o possuidor direto, como o possuidor indireto, poderão exigir judicialmente segurança contra a violência iminente na ameaça de turbação ou esbulho.
O interdito proibitório só produz efeitos depois de julgado por sentença. Em sendo procedente a ação, o juiz proibirá o réu de praticar o ato, sob pena de aplicação de multa, e pagamento de perdas e danos, em favor do autor ou de terceiro.
Para propor o interdito proibitório basta que o possuidor demonstre um receio fundado ou justo de que a violência ocorrerá, não importando se há verdadeira intenção do réu em praticar ou não a turbação ou o esbulho.
3. Efeito da posse: o possuidor tem direito à percepção de frutos
Frutos são utilidades que a coisa periodicamente produz e cuja percepção se dá sem detrimento de sua substância.
3.1 Classificação dos frutos
Quanto à sua origem, o frutos se classificam em:
– naturais, que são aqueles que se renovam periodicamente em função da própria natureza, como, por exemplo, animais e colheitas;
– industriais, fruto da atividade humana, ou seja, da atuação do homem sobre a natureza como matéria-prima, a exemplo da produção de um fábrica, e
– civis ou particulares, que são aqueles provenientes de renda oriunda da utilização de uma coisa, enfim juros, dividendos e aluguéis.
Em relação a sua percepção, que é o ato material pelo qual o possuidor se torna proprietário dos frutos, dividem-se em:
– pendentes, que são os frutos unidos à coisa principal;
– percebidos, os frutos colhidos no seu tempo adequado;
– estantes, frutos que se encontram armazenados para venda;
– percipiendos, frutos que já poderiam ser colhidos ou prontos para colheita, e
– consumidos, que são os frutos que não mais existem, por terem sido utilizados.
3.2 Direito aos frutos
Prevê o art. 1.214 do Código Civil:
Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.
Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação.
Código Civil
O possuidor de boa fé tem direito aos frutos percebidos, tal como se fosse o proprietário do bem. Pode, portando, usar e gozar da coisa, retirando dela todas as suas vantagens, sendo que a boa fé do possuidor deve ser apreciada no momento da percepção.
Por sua vez, deve haver a restituição dos frutos pendentes no momento em que cessar a boa fé, porém, para que se evite o enriquecimento ilícito, a restituição se dará deduzindo-se as despesas para a sua produção e custeio.
Note que, se o fruto está pendente, integra a coisa, aplicando-se, portanto, o princípio de que o acessório segue o principal. Por sua vez, caso o fruto tenha sido colhido por antecipação, deveria ainda integrar a coisa, aplicando-se, igualmente, o mesmo princípio.
Art. 1.215. Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que são separados; os civis reputam-se percebidos dia por dia.
Código Civil
Os frutos naturais e industriais são considerados colhidos e percebidos no momento em que são separados da coisa, como no exemplo das frutas de um pomar e dos produtos produzidos por uma fábrica. Já os frutos civis são reputados percebidos dia a dia que é o caso dos juros e de alugúeis
Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio.
Código Civil
O art. 1.216 pune o dolo, a malícia e a má fé, pois o possuidor de má fé responde por todos os prejuízos que causou pelos frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, tendo, porém, direito às despesas de produção e custeio, a fim de se evitar enriquecimento ilícito, mas não tem direito à quaisquer frutos.
4. Efeito da posse: direito à indenização das benfeitorias
De acordo com o Código Civil (art. 1.219), o possuidor tem direito à indenização das benfeitorias, que são obras ou despesas para conservação da coisa, para o seu melhoramento ou para o seu embelezamento.
Para entender quais benfeitorias são passíveis de indenização conforme as circunstâncias, é importante saber a sua classificação.
4.1 Classificação das benfeitorias
Não existem benfeitorias naturais, todas são artificiais e realizadas no corpo da coisa principal, portanto, as benfeitorias não aumentam o tamanho do bem.
As benfeitorias, no entanto, podem aumentar ou conservar o valor do bem, sendo passíveis de indenização.
Conforme o art. 96, do Código Civil, as benfeitorias classificam-se em:
– Úteis: as que aumentam ou facilitam o uso do bem;
– Necessárias: as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore;
– Voluptárias: as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor.
4.2 Posse de boa fé e indenização das benfeitorias úteis, necessárias e voluptárias
Vejamos, agora, o que prevê o art. 1.219 do Código Civil acerca da indenização das benfeitorias:
Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.
Código Civil
No caso do exercício de posse de boa fé, o possuidor, que for privado do bem em favor do reivindicante ou evictor, terá direito de à indenização das benfeitorias necessárias e úteis.
Quanto às benfeitorias voluptárias, poderá levantá-las, se não lhe forem pagas, desde que não danifique a coisa.
4.3 Posse de má fé e indenização das benfeitorias necessárias
Se o possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, como também, ao levantamento das benfeitorias voluptárias, o possuidor de má fé, por sua vez, somente tem direito à indenização das benfeitorias necessárias:
Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.
Código Civil
Conforme o art. 1.221 do Código Civil, as benfeitorias compensam-se com os danos, e só obrigam ao ressarcimento se ao tempo da evicção ainda existirem.
Já o art. 1.222 dispõe que o reivindicante, que tiver a indenizar as benfeitorias ao possuidor de má-fé, tem o direito de optar entre o seu valor atual e o seu custo – ao possuidor de boa-fé a indenização se dará pelo valor atual.
4.4 Direito de retenção como meio de defesa
Consequência do direito à indenização das benfeitorias, é o direito de retenção (art. 744, CPC), que é o direito do devedor de uma obrigação reter o bem alheio em seu poder até que o credor lhe indenize das despesas feitas em beneficio da coisa.
A lei confere ao possuidor o direito de retenção (jus retentionis) como um meio de defesa para conservar em seu poder a coisa alheia além do momento em que a deveria devolver, funcionando, dessa forma, como uma garantia de pagamento das despesas feitas com o bem.
Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.
Código Civil
5. Efeito da posse: responsabilidade por deterioração ou perda da coisa
O possuidor é responsável pelas deteriorações ou perda da coisa, sendo que o possuidor de boa fé não responde pela perda ou deterioração a que não der causa:
Art. 1.217. O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da coisa, a que não der causa.
Código Civil
Tanto o possuidor de boa-fé, como o de má-fé, respondem pela deterioração ou perda da coisa, porém, o possuidor de boa-fé terá excluída a sua responsabilidade no caso de não ter dado causa ao dano.
Art. 1.218. O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do reivindicante.
Código Civil
Pelo que prevê o Código Civil, o possuidor de má-fé, responde pela perda e deterioração, mas poderá exonerar-se dessa responsabilidade se demonstrar que esses fatos se verificariam de qualquer modo, ainda que estivesse o bem em poder do reivindicante.
6. Efeito da posse: direito à usucapião
A usucapião é um modo originário de aquisição da propriedade sendo que, um dos seus requisitos, é o exercício da posse continuada sobre a coisa. Saiba mais sobre usucapião.
7. Efeito da posse: distribuição do ônus da prova em favor do possuidor
Havendo contestação da posse, o ônus da prova compete ao adversário do possuidor. No caso do autor da ação, não provar o seu direito, a posse continua em nome do réu, ou seja, do possuidor. Saiba mais sobre distribuição do ônus da prova.
8. Efeito da posse: posição mais favorável para defesa do direito de propriedade
O possuidor goza de posição mais favorável para, eventualmente, defender o direito de propriedade, sobretudo pela noção de que a posse da coisa presume a sua propriedade. Nesse sentido, em relação a bens móveis, o art. 1.209 dispõe que a posse do imóvel faz presumir, até prova em contrário, a das coisas móveis que nele estiverem, como também, o art. 1.211, que prevê que quando mais de uma pessoa se disser possuidora, manter-se-á provisoriamente a que tiver a coisa, se não estiver manifesto que a obteve de alguma das outras por modo vicioso.
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