O que é bem de família e por que ele não pode ser penhorado

O que é bem de família e por que ele não pode ser penhorado é algo que deve ser de conhecimento de todos, sobretudo pela importância que assume o direito à moradia na vida das pessoas.

Por Emerson Souza Gomes

Como já tratei em post veiculado no blog, a moradia é um direito previsto como direito fundamental na Constituição da República, como também, constitui um direito humano, constando na Declaração dos Direitos Humanos, de 1948.

O ordenamento jurídico trata do “bem de família” em dois diplomas legais: na lei 8.009, de 29 de março de 1990, uma lei especial que trata especificamente da impenhorabilidade do bem de família, e no Código Civil, dentre as normas que tratam do direito de família, nos artigos 1.711 a 1.722.

Sem exaurir o tema – que ainda é alvo de controvérsias acirradas no Poder Judiciário – este post traça linhas gerais a respeito do conceito e da impenhorabilidade do bem de família na lei 8.009/90.

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A impenhorabilidade do bem de família prevista na Lei 8.009/90

Vamos lá, a lei 8.009/90, uma lei especial que trata especificamente da impenhorabilidade do bem de família, dispõe, em seu art. 1º, que:

O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas em lei.”

Conforme a lei, para os efeitos de impenhorabilidade, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente (art. 5º).

Vale citar que a Súmula 364, do Superior Tribunal de Justiça, estende a impenhorabilidade também a pessoas solteiras, casadas e viúvas:

O conceito de impenhorabilidade do bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, casadas e viúvas (SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, 2008).”

Quando pode ser alegada a impenhorabilidade do bem de família

Ainda que não passível de penhora para pagamento de dívidas, pode o bem de família vir a ser equivocadamente penhorado em ação judicial, devendo o proprietário alegar a sua impenhorabilidade.

Neste caso, conforme o Superior Tribunal de Justiça, a impenhorabilidade do bem de família pode ser alegada em qualquer momento processual, até a sua arrematação, ainda que por simples petição nos autos (Jurisprudência em tese, n. 44, STJ)

Impenhorabilidade no caso da família possuir mais de uma residência

Na hipótese de o casal, ou entidade familiar, possuidor vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis (art. 5º, parágrafo único).

Aqui, a lei faz referência à impenhorabilidade do bem de família prevista no Código Civil, que, no art. 1.711, prevê:

Podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial.”

A respeito da instituição de um bem imóvel como bem de família, sugiro ler o post do blog Registro de bem de família em cartório.

O que compreende a impenhorabilidade do bem de família

A impenhorabilidade do bem de família compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados (art.1º, parágrafo único).

O que compreende a impenhorabilidade do bem de família em área rural

Quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural (art. 4º, § 2º).

O que é excluído da impenhorabilidade do bem de família

Excluem-se da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos (art. 2º).

O que compreende a impenhorabilidade de imóvel alugado

No caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica-se aos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário, observado o disposto neste artigo. (art. 2º, parágrafo único)

Para o Superior Tribunal de Justiça:

É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família. (STJ, Súmula 486)

Exceções à impenhorabilidade do bem de família

É bom ficar atento, a impenhorabilidade do bem de família tem exceções. A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido (art. 3º):

a) pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;

b) pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida;                 

c) para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;

d) para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;

e) por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.

f) por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Quanto à hipótese do bem de família ser penhorável por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de aluguel ou de locação, vale a pena você ler o post “Penhora do bem de família do fiador em contrato de aluguel” que trata deste tema; inclusive, a impenhorabilidade do bem de família do fiador em contrato de locação comercial ou mercantil, ainda é uma questão que não está pacificada frente ao Poder Judiciário. Leia o post e fique por dentro!

Aquisição de má-fé de imóvel mais valioso

Não se beneficiará do disposto na lei 8.009/90 aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga (art. 4º).

Neste caso, poderá o juiz, na respectiva ação do credor, transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular-lhe a venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso, conforme a hipótese (art. 4º., § 1º).

O que dizem os Tribunais

Processual Civil.  Civil.  Recurso Especial.  Bem de família.  Propriedade de mais de um imóvel. Residência. – É possível considerar impenhorável o imóvel que não é o único de propriedade da família, mas que serve de efetiva residência.  – Recurso especial provido” (REsp  435.357/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,  TERCEIRA TURMA, julgado em 29/11/2002, DJ03/02/2003, p. 315)

“BEM DE FAMÍLIA. Lei 8009/90. Usufruto. Está excluído da penhora o imóvel que serve de moradia ao titular da nua-propriedade. Recurso conhecido e provido.”(REsp 329453/SP. Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar. Órgão julgador: T4 Quarta Turma. Data do julgamento: 02/04/2002; DJe 20/05/2002).

Base legal

Declaração dos Direitos Humanos

Constituição Federal da República

Lei 8.009/90

Código Civil

STJ – Jurisprudência em tese, n. 44

Emerson Souza Gomes, advogado especialista em direito empresarial, sócio da Gomes Advogados Associados, email emerson@gomesadvogadosassociados.com.br, fone (47) 3444-1335
Emerson Souza Gomes, advogado especialista em direito empresarial, sócio da Gomes Advogados Associados, email emerson@gomesadvogadosassociados.com.br, fone (47) 3444-1335

Por Emerson Souza Gomes

Advogado, sócio do escritório Gomes Advogados Associados, www.gomesadvogadosassociados.com.br.

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