Usucapião extingue hipoteca. A promessa de compra e venda caracteriza justo título útil a declarar a propriedade de imóvel pela usucapião ordinária, decide STJ. Com a declaração de aquisição de domínio por usucapião, desaparece o gravame real hipotecário.
Promessa de compra e venda caracteriza justo título para usucapião
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confere ao promitente comprador o direito à adjudicação compulsória do imóvel independentemente de registro:
O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis.
STJ, Súmula 239
De outra parte, o registro do compromisso de compra e venda na matrícula do imóvel tem natureza de direito real:
Art. 1.225. São direitos reais:
(…)
VII – o direito do promitente comprador do imóvel;
Código Civil
Assim, é natural que a promessa de compra e venda seja também um “justo título” apto a ensejar a aquisição da propriedade por usucapião.
Presume-se a boa-fé do adquirente, nos termos do art. 1.201, parágrafo único, do Código Civil:
Art. 1.201. É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa.
Parágrafo único. O possuidor com justo título tem por si a presunção de boa-fé, salvo prova em contrário, ou quando a lei expressamente não admite esta presunção.
Código Civil
Execução de hipoteca não interrompe prazo de usucapião
Quando a lei se refere a posse “incontestada”, há referência às causas interruptivas da prescrição aquisitiva.
Um exemplo de causa interruptiva é a citação em ação onde terceiro opõe resistência ao possuidor da coisa.
Por esse raciocínio, é evidente que os efeitos interruptivos da citação não alcançam a posse de quem nem era parte no processo.
Assim, o ajuizamento de execução hipotecária por credores contra o proprietário do imóvel, não interrompe o prazo prescricional da usucapião por parte de terceiros.
A execução não constitui resistência à posse ad usucapionem de quem ora pleiteia a prescrição aquisitiva.
O que é usucapião
A usucapião é uma forma de aquisição originária da propriedade ou de outros direitos reais.
Através da usucapião, há expressa oposição à aquisição derivada da propriedade (e.v. compra e venda).
Na usucapião não existe transmissão de propriedade, tal como ocorre na aquisição derivada, onde há uma legítima sucessão de forma singular ou de forma universal.
Na usucapião a propriedade não se adquire do anterior proprietário, mas contra ele, sendo a propriedade absolutamente nova, não derivando da antiga.
A propriedade é adquirida a partir da objetiva situação de fato consubstanciada na posse ad usucapionem pelo interregno temporal.
É até mesmo desimportante a existência de um antigo proprietário.
Usucapião extingue hipoteca
Os direitos reais de garantia não subsistem se desaparecer o “direito principal” que lhe dá suporte.
Por exemplo, caso haja perecimento da propriedade por qualquer motivo, extingue-se o direito real.
Com a usucapião, a propriedade anterior, gravada pela hipoteca, extingue-se.
Surge, assim, uma outra propriedade que não decorre da antiga, porquanto não há transferência de direitos, mas aquisição originária.
Se a própria propriedade anterior se extingue, dando lugar a uma nova, originária, tudo o que gravava a antiga propriedade também se extinguirá.
Com a declaração de aquisição de domínio por usucapião, desaparece o gravame real hipotecário constituído pelo antigo proprietário.
Isso, antes ou depois do início da posse ad usucapionem, seja porque a sentença apenas declara a usucapião com efeitos ex tunc, seja porque a usucapião é forma originária de aquisição de propriedade.
Por fim, segundo a Súmula 308, do STJ, “a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel” (Súmula n. 308).
Fonte: REsp n. 941.464/SC, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 24/4/2012, DJe de 29/6/2012
Leia também
+ Usucapião: qual documento é considerado “justo título”
+ Usucapião: requisitos e documentos necessários
+ Invadiram o meu terreno: o que fazer?