Aluguel em atraso: o que muda com a pandemia

Aluguel em atraso: o que muda com a pandemia

Aluguel em atraso: o que muda com a pandemia

Crise sanitária e novas leis

Com a crise sanitária a produção legislativa se viu intensificada. No Brasil, a exemplo de outros países, fez-se necessário rever vários pontos do sistema jurídico com o objetivo de mitigar os efeitos deletérios do Coronavírus.

Nem sempre as inovações legais são do agrado de todos, porém, dado o momento em que vivemos, atravessar a crise requer um esforço comum, o que implica – sem chancelarmos oportunismos – em suportarmos limitações em nosso patrimônio jurídico.

PL 1.179/2020

Nesta ótica, surge o Projeto de Lei 1.179/2020 estabelecendo um regime emergencial e transitório a ser aplicado em diversas relações jurídicas do direito privado no período de pandemia do Coronavírus.

Contratos, prisão por atraso no pagamento de pensão alimentícia, inventários, serviços de Uber, usucapião, dentre outros pontos, são abordados no referido PL que, já aprovado pela Câmara e Senado, depende tão somente da sanção do Presidente da República para que suas alterações ingressem no ordenamento jurídico.

Neste post vou dedicar atenção aos contratos de locação de imóvel urbano, alvo do PL, sobretudo, no que se refere à “ação de despejo”, instrumento jurídico utilizado pelo proprietário para retomada do imóvel locado em função do atraso no pagamento dos aluguéis pactuados.

Antes de ingressar nas alterações, vou discorrer, de forma breve, sobre como funciona a rigor a ação de despejo para que fiquem mais claras as alterações propostas no PL. Vamos lá!

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O que é a ação de despejo

A ação de despejo está prevista na Lei 8.245/91, que dispõe sobre a locação de imóveis urbanos, tendo por objetivo a retomada do imóvel locado e, eventualmente, a cobrança de alugueis em atraso.

Quando é utilizada a ação de despejo

A ação de despejo é utilizada em circunstâncias pontuais, previstas na Lei de Locação, sendo comum a sua utilização no caso de descumprimento de cláusula pactuada como, por exemplo, na falta de pagamento de aluguéis – um fato que passou a ser corriqueiro em função da pandemia.

Falta de pagamento de aluguéis

Pela Lei de Locação, caso o locatário não efetue pagamento do aluguel e dos encargos avençados, não havendo garantias previstas no contrato, a Lei faculta ao locador requerer em juízo a desocupação liminar do imóvel, que poderá ocorrer em até 15 dias. – Este ponto é bastante importante (refiro-me à decisão liminar para desocupação do imóvel) já que sofrerá alteração caso o PL seja aprovado sem vetos.

Assim, pela Lei em vigor, a desocupação do imóvel, na ação de despejo, funciona de forma bastante ágil, nem mesmo sendo necessária a realização de audiência para ouvir as partes. Cumprindo os requisitos legais, como a prestação de garantia de 3 aluguéis, o locador poderá reaver o seu imóvel.

Em suma, ingressou com a ação: retomou o imóvel alugado.

Defesa do locatário

Ainda que tenha sido deferida pelo juiz a liminar para desocupar o imóvel, é certo que o locatório, em um prazo de 15 dias, poderá apresentar sua defesa, inclusive, com o objetivo de permanecer no imóvel, pedindo para que seja revogada a liminar.  

No caso da alegação da falta de pagamento de aluguéis por parte do locador, é imprescindível que, junto à defesa, o locatório apresente a prova da sua quitação [dos aluguéis inadimplidos], preferencialmente com documentos, como o depósito bancário ou recibo de quitação.

Colocando em dia os aluguéis

Em outra hipótese, tendo o locador ingressado com o pedido de despejo, e os aluguéis estiverem, de fato, em atraso, ainda há a oportunidade do locatório permanecer no imóvel.

Para tanto, terá que colocar em dia: i) aluguéis e acessórios da locação, como contas de energia, água ou condomínio; ii) multas ou penalidades contratuais, quando exigíveis; iii) juros de mora; iv) custas do processo e os honorários do advogado do locador.

24 meses

Importante deixar claro que o locatório somente poderá se valer da prerrogativa acima – pagar aluguéis depois que houver sido interposta a ação de despejo – uma vez a cada 24 meses.

A disposição legal tem por finalidade evitar que o locador só consiga receber o valor referente à locação recorrendo ao Judiciário.

O que muda no contrato de locação com a pandemia

De acordo com o PL 1.179/2020, ficará mais difícil para o locador retomar o imóvel locado por falta de pagamento.

Conforme o art. 9º, do PL, “não se concederá liminar para desocupação de imóvel urbana nas ações de despejo, a que se refere o art. 59, parágrafo 1º., incisos I, II, V, VII, VIII e IX, da Lei n. 8.245, de 18 de 0utubto de 1991, até 30 de outubro de 2020”.

Assim, conforme o PL, em ações de despejo, onde a “razão” do locador para desocupação do imóvel for a falta de pagamento de alugueis, não poderá mais ser concedida uma decisão liminar para desocupação do imóvel.

Com isso, ainda que interposta a ação de despejo, o locatário terá o direito de permanecer no imóvel, mesmo com alugueis em atraso e até o julgamento da ação.

A alteração é bastante significante, posto que o benefício da liminar em favor do locador faz com que o locatário, com aluguéis em atraso, tenha que desocupar o imóvel comumente no início do processo judicial.

A alteração legal tem efeito retroativo

Outro ponto que merece destaque é o efeito retroativo do PL. De acordo com o parágrafo único, do seu art. 9º. “o disposto no caput deste artigo aplica-se apenas às ações ajuizadas a partir de 20 de março de 2020.”

Desta forma, ações de despejo que foram ajuizadas a partir de 20 de março deste ano também se submetem ao previsto no projeto de lei, ou seja, o locatário não pode ser despejado do imóvel por intermédio de liminar.

Nesta inteligência, aquelas famílias que tiveram que desocupar o imóvel alugado em razão de uma decisão liminar, poderão, a rigor, pleitear no respectivo processo judicial o direito de retornarem ao imóvel.

Quanto tempo durará a mudança

Como já mencionado, o Projeto de Lei 1.179/2020 estabelece um regime “emergencial e transitório”. Ou seja, as suas regras têm um tempo predeterminado de vigência, valendo as suas disposições até 30 de outubro deste ano, conforme preceitua o seu art. 9º.

Sob a ótica do locador, isto significa que ele terá que aguardar o julgamento final da ação para reaver o imóvel, ou esperar a data de 30 de outubro deste ano, quando voltará a ser possível ser beneficiado por uma decisão liminar.

Negociar e conciliar

Com a pandemia, todos tivemos que nos adaptar, alterando sobretudo hábitos e a forma como nos relacionamos. Em demandas judiciais, da mesma forma, precisamos nos adequar à nova realidade e, como advogado, posso afirmar que “negociar” e “conciliar” são duas atitudes que vão ter que ser incorporadas à conduta de cada um de nós, afinal, o momento é de união e não de discórdia, além de confiar que…

…[tomara] dias melhores virão!

Base Legal

Lei 8.245, de 18 de outubro de 1991.

Art. 59. Com as modificações constantes deste capítulo, as ações de despejo terão o rito ordinário.

§ 1º Concederse-á liminar para desocupação em quinze dias, independentemente da audiência da parte contrária e desde que prestada a caução no valor equivalente a três meses de aluguel, nas ações que tiverem por fundamento exclusivo:

(omissis)

IX – a falta de pagamento de aluguel e acessórios da locação no vencimento, estando o contrato desprovido de qualquer das garantias previstas no art. 37, por não ter sido contratada ou em caso de extinção ou pedido de exoneração dela, independentemente de motivo.

(omissis)

§ 3o  No caso do inciso IX do § 1o deste artigo, poderá o locatário evitar a rescisão da locação e elidir a liminar de desocupação se, dentro dos 15 (quinze) dias concedidos para a desocupação do imóvel e independentemente de cálculo, efetuar depósito judicial que contemple a totalidade dos valores devidos, na forma prevista no inciso II do art. 62.

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