É possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização dos sócios?

É possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização dos sócios?

É possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização dos sócios?

Nas pessoas jurídicas de pequeno porte, o gestor pode ser responsabilizado pela prática de crime ambiental em favor da empresa.

(post atualizado em 20 de janeiro de 2021)

Responsabilidade civil, administrativa e penal

Por sua natureza, a atividade industrial é geradora de resíduos sólidos e produz poluição. Diante disso, a legislação ambiental traça limites e condições para o exercício da atividade econômica da indústria, como também, de toda e qualquer atividade potencialmente poluente.

Atento à necessidade de promover o desenvolvimento sustentável, e de evitar a degradação ambiental, o constituinte entendeu por bem imputar responsabilidade às empresas  por danos ao meio ambiente, não só no campo civil e administrativo, mas, igualmente, na seara penal; pois vejamos:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

(omissis)

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Constituição Federal da República

A Constituição prevê a tríplice responsabilidade de pessoa física ou jurídica em função de dano ao meio ambiente, podendo ser aplicáveis, em função de um mesmo fato, sanções penais, administrativas e civis.

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Acerca do dispositivo constitucional, a possibilidade de responsabilização penal da pessoa jurídica foi alvo de discussões acirradas, defendendo-se a impossibilidade de empresas responderem pela prática de um crime, já que, a par das pessoas jurídicas terem existência fictícia, não possuem “vontade”. Em sendo os seus representantes que tomam decisões teriam eles que responder pela prática de eventual crime.

Para  os detratores dessa tese, a pessoa jurídica seria dotada de “vontade própria” distinta da de seus membros. A vontade da pessoa jurídica seria a convergência da vontade do corpo social, mediante deliberações e votos, respondendo, portanto, a empresa pelo cometimento de eventual ilícito penal.

A Lei dos Crimes Ambientais pôs fim à controvérsia

Com o advento da Lei 9.605-98 – Lei dos Crimes Ambientais – regulamentando o dispositivo constitucional, na atualidade, resta vencida qualquer discussão, sendo inquestionável a possibilidade de pessoa jurídica figurar em ação penal em virtude do cometimento de crime ambiental:

Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.

Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato.

Lei 9.605/98

No que compete às penas previstas para empresas, tendo em conta à impossibilidade manifesta da aplicação de pena privativa de liberdade, a lei de crimes ambientais dispôs penas específicas a serem aplicadas à pessoa jurídica que cometer um ilícito penal, tais como multas, restrições de direitos, suspensão parcial ou total de atividades, interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade e proibição de contratar com o poder público.

Em regra, sócios não respondem por ilícito penal cometido pela pessoa jurídica

No que se refere a possibilidade da responsabilização penal dos sócios juntamente da pessoa jurídica, pode-se afirmar que, em regra, a prática de crime ambiental não implica em uma simultânea persecução penal. Nesse sentido, já se manifestou o Supremo Tribunal Federal:

“Conforme orientação da Primeira Turma do STF, “O art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação” (RE 548.181, Primeira Turma, DJe 29/10/2014). Diante dessa interpretação, o STJ modificou sua anterior orientação, de modo a entender que é possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização concomitante da pessoa física que agia em seu nome. Precedentes citados: RHC 53.208-SP, Sexta Turma, DJe 1º/6/2015; HC 248.073-MT, Quinta Turma, DJe 10/4/2014; e RHC 40.317-SP, Quinta Turma, DJe 29/10/2013. RMS 39.173-BA, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 6/8/2015, DJe 13/8/2015.”

Pessoas jurídicas de pequeno porte: o domínio do fato

A despeito da regra geral, que acena pela não-imputação penal dos sócios por crimes ambientais praticados pela pessoa jurídica, no caso de pessoa jurídicas de pequeno porte, o Superior Tribunal de Justiça tem firme o entendimento de que, nessas empresas, onde as decisões são unificadas no seu gestor, é aplicável a teoria do domínio do fato,  admitindo-se que o mesmo seja responsabilizado pela prática da conduta delituosa, respondendo, assim, pelo crime ambiental.

Vale, por fim, destacar que nos crimes ambientais praticados por pessoa jurídica, diretores, administradores, gerentes, prepostos, mandatários ou quaisquer outras pessoas ligadas à empresa, também podem responder pelo crime quando comprovada omissão no exercício de suas funções.

Base legal

Constituição

Lei 9.605/98

Fonte: STJ, informativo nº 566, agosto de 2015 

Jurisprudência: crime ambiental, responsabilização sócios

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME AMBIENTAL. AUSÊNCIA DE OMISSÃO. ART. 68 DA LEI Nº 9.605/98. RESPONSABILIDADE PESSOAL DO GESTOR. SÓCIO COM DOMÍNIO DO FATO. EMPRESA DE GRANDE PORTE. SÚMULA 7/STJ. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AGRAVANTE PREVISTA NO ARTIGO 15, INCISO II, ALÍNEA “A”, DA LEI Nº 9.605/98.
INCIDÊNCIA. VALOR DO DIA-MULTA EXACERBADO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Não há falar em omissão, uma vez que o acórdão recorrido apreciou as teses defensivas com base nos fundamentos de fato e de direito que entendeu relevantes e suficientes à compreensão e à solução da controvérsia, o que, na hipótese, revelou-se suficiente ao exercício do direito de defesa. 2. O entendimento do STJ é no sentido de que a superveniência da sentença penal condenatória torna esvaída a análise do pretendido reconhecimento de inépcia da denúncia, isso porque o exercício do contraditório e da ampla defesa foi viabilizado em sua plenitude durante a instrução criminal (AgRg no AREsp 537.770/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, julgado em 4/8/2015, DJe 18/8/2015), como no presente caso.
Salienta-se que, mesmo que o Juízo de primeiro grau tenha proferido sentença absolutória, conclui-se que, para examinar as provas amealhadas aos autos, considerou, primeiramente, a higidez da inicial acusatória e o preenchimento de todas as formalidades necessárias à persecução criminal (AgRg no REsp 1347288/PE, Rel.
Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 10/03/2016, DJe 17/03/2016).

  1. Ademais, conforme se observa na denúncia, houve a narrativa da conduta criminosa imputada ao acusado acerca da prática do crime em questão, com todas as circunstâncias relevantes, de maneira suficiente ao exercício do direito de defesa. Assim, nos termos da jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, não há como reconhecer a inépcia da denúncia se a descrição da pretensa conduta delituosa foi feita de forma suficiente ao exercício do direito de defesa, com a narrativa de todas as circunstâncias relevantes, permitindo a leitura da peça acusatória a compreensão da acusação, com base no artigo 41 do Código de Processo Penal (RHC n. 46.570/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado em 20/11/2014, DJe 12/12/2014). 4. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que, não sendo o caso de grande pessoa jurídica, onde variados agentes poderiam praticar a conduta criminosa em favor da empresa, mas sim de pessoa jurídica de pequeno porte, onde as decisões são unificadas no gestor e vem o crime da pessoa jurídica em seu favor, pode então admitir-se o nexo causal entre o resultado da conduta constatado pela atividade da empresa e a responsabilidade pessoal, por culpa subjetiva, de seu gestor (RHC n# 71.019/PA, Rel. Ministro NEFI CORDEITO, SEXTA TURMA, DJe 26/8/2016). 5. Pela leitura do acórdão recorrido, verifica-se que a pessoa jurídica onde teriam ocorrido as infrações ambientais – Viação Planalto Ltda – Viplan – é empresa em que figuram como sócios o acusado, sua esposa e seus filhos. Assim, não se trata de pessoa jurídica de grande porte, mas de uma empresa familiar, cujos cargos de direção e administração são exercidos pelos próprios sócios. essa forma, o réu que, na época, exercia a gestão centralizada e pessoal, tendo plenos poderes de gerência sobre as atividades nela desenvolvidas. detinha o domínio dos fatos delitivos ora analisados, devendo responder por eles. 6. Concluir que a empresa em questão é de grande porte, o que impediria o envolvido de responder pelo tipo penal, como requer a parte recorrente, demandaria o revolvimento de matéria fático-probatória, o que é inviável em sede de recurso especial, por força da incidência da Súmula n. 7/STJ. 7. No tocante à fixação da pena-base acima do mínimo legal, cumpre registrar que a dosimetria da pena está inserida no âmbito de discricionariedade do julgador, estando atrelada às particularidades fáticas do caso concreto e subjetivas dos agentes, elementos que somente podem ser revistos por esta Corte em situações excepcionais, quando malferida alguma regra de direito. No presente caso, pode haver a valoração negativa da circunstância da culpabilidade, pelo fato do acusado ter deixado de providenciar a licença necessária ao funcionamento da garagem e de não ter cumprido as exigências dos autos de infração lavrados pelo órgão de fiscalização, além de não ter respeitado, por duas vezes, a ordem de interdição do estabelecimento, o que demonstra uma maior reprovabilidade da conduta, desbordando do tipo penal, motivo pelo qual pode ser sopesada. 8. Não há qualquer ilegalidade na aplicação da agravante prevista no artigo 15, inciso II, alínea “a”, da Lei nº 9.605/98, uma vez que, conforme a Corte de origem, o delito foi cometido com o objetivo de obter vantagem pecuniária, uma vez que as condutas foram praticadas no âmbito da atividade empresarial do réu, que descumpriu ordem de interdição do estabelecimento comercial com o objetivo de dar continuidade ã atividade e, assim, obter vantagem pecuniária.
  2. Por fim, as teses de que o valor do dia-multa seria exacerbado e de que o acórdão condenatório não estaria fundamentado não foram debatidas na instância de origem, apesar da oposição de embargos de declaração, o que atrai, os óbices das Súmulas n. 282/STF e 211/STJ.
  3. Agravo regimental não provido.
    (AgRg no AREsp 1527212/DF, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 19/09/2019, DJe 27/09/2019)

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