Pequena propriedade rural

A pequena propriedade rural trabalhada pela entidade familiar é impenhorável, mesmo quando oferecida em garantia hipotecária pelos respectivos proprietários. Precedentes. Segundo a jurisprudência desta corte, “em razão da presunção juris tantum em favor do pequeno proprietário rural, transfere-se ao exequente o encargo de demonstrar que não há exploração familiar da terra, para afastar a hiperproteção da pequena propriedade rural”

Processo: 5071915-15.2022.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Silvio Dagoberto Orsatto
Origem: Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Orgão Julgador: Primeira Câmara de Direito Civil
Julgado em: 14/12/2023
Classe: Agravo de Instrumento

Agravo de Instrumento Nº 5071915-15.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador SILVIO DAGOBERTO ORSATTO

AGRAVANTE: ANTONIO ADAIR MEDEIROS AGRAVANTE: MARIA VALQUIRIA TILL MEDEIROS AGRAVANTE: ROBSON LUHAN MEDEIROS AGRAVADO: COPERMAP – COOPERATIVA MULTIPLA DE AGRICULTURA E PECUARIA

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por A. A. M., M. V. T. M. e R. L. M. em face da decisão prolatada pelo juízo 2ª Vara Cível da comarca de Campos Novos que, nos autos da Execução de Título Extrajudicial n. 5000284-71.2019.8.24.0014, ajuizada por C. – C. M. de A. e P., que manteve a penhora incidente sobre o imóvel dos agravantes, nos seguintes termos (Evento 240, DESPADEC1 – autos de origem):
(…) na hipótese, embora tenha sido demonstrada que a dimensão do imóvel matriculado sob o  n. 9.168 do 2º Ofício do Registro de Imóveis de Lages/SC se encaixa no conceito de pequena propriedade rural, não restou demonstrado nos autos que a terra rural é trabalhada e/ou habitada pela família, tampouco de que dela é que se extrai o sustento familiar. Nenhum documento nesse sentido veio aos autos.
Além disso, note-se que o autor possui outro imóvel, na mesma localidade, matriculado sob o n. 8.476, dado em garantia ao contrato firmado pelas partes, ora executado (evento 1, CONTR5).
(…)
Nesse diapasão, os argumentos reverberados pela parte executada se apresentam como mera alegação, não cumprindo o ônus que lhe incumbia, a teor do art. 373 do CPC, de modo que o pleito de impenhorabilidade do imóvel constrito não merece acolhimento.
Ante o exposto:
I – MATENHO a decisão constante do evento 31, que determinou a penhora do imóvel matriculado sob o n. 9.168 do 2º Ofício do Registro de Imóveis de Lages/SC (evento 31, DESPADEC1).
Inconformados com os termos do decisum, os agravantes sustentaram, em síntese, que o imóvel objeto da lide é impenhorável, sendo (…) “que a utilização da terra para a subsistência da família é presumida, assim, o ônus da prova em sentido contrário é do credor”.
Após tecerem outras considerações sobre a matéria, pugnaram pelo deferimento do efeito suspensivo e, a final, pelo provimento do agravo (Evento 1 –  INIC1 – pp. 1-8).
Deferida a medida suspensiva postulada (Evento 23, DESPADEC1), intimada, a parte agravada apresentou contrarrazões sustentando, em suma, que não há exploração familiar da terra, momente considerando que um dos executados é vereador na cidade de São Jose do Cerrito. Em razão disso, requereu o desprovimento do recurso  (Evento 34, CONTRAZ1).
Sem necessidade da remessa dos autos à Procuradoria-Geral da Justiça, os autos vieram conclusos.
É o relatório.

VOTO

Exame de Admissibilidade Recursal
Preenchidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conhece-se do recurso e passa-se à sua análise.
Mérito
De plano, cumpre ressaltar que, em sede de Agravo de Instrumento, o julgamento deve ater-se ao acerto ou eventual desacerto da decisão proferida pelo juízo a quo, abstraindo-se o quanto possível de adentrar-se ao meritum causae, cingindo-se, pois, à decisão vergastada.
Após detida análise dos autos, adota-se, em definitivo, a conclusão alcançada quando do deferimento do pedido de efeito suspensivo (Evento 23 – DESPADEC1).
Isso porque nada obstante os fundamentos do decisum objurgado, tem-se que o entendimento jurisprudencial dominante permanece no sentido de que a hiperproteção à pequena propriedade rural concedida pelo ordenamento jurídico confere presunção juris tantum em favor do proprietário, incumbindo ao exequente comprovar de que o imóvel não é indispensável ao sustento do executado e sua família.
A propósito, já assentou o Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. IMPENHORABILIDADE. PEQUENA PROPRIEDADERURAL. REQUISITOS E ÔNUS DA PROVA.1. A proteção da pequena propriedaderural ganhou status Constitucional, tendo-se estabelecido, no capítulo voltado aos direitos fundamentais, que a referida propriedade, “assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento” (art. 5°, XXVI). Recebeu, ainda, albergue de diversos normativos infraconstitucionais, tais como: Lei n° 8.009/90, CPC/1973 e CPC/2015.2. O bem de família agrário é direito fundamental da família rurícola, sendo núcleo intangível – cláusula pétrea -, que restringe, justamente em razão da sua finalidade de preservação da identidade constitucional, uma garantia mínima de proteção à pequena propriedade rural, de um patrimônio mínimo necessário à manutenção e à sobrevivência da família.3. Para fins de proteção, a norma exige dois requisitos para negar constrição à pequena propriedade rural: i) que a área seja qualificada como pequena, nos termos legais; e ii) que a propriedade seja trabalhada pela família.4. É ônus do pequeno proprietário, executado, a comprovação de que o seu imóvel se enquadra nas dimensões da pequena propriedade rural.5. No entanto, no tocante à exigência da prova de que a referida propriedade é trabalhada pela família, há uma presunção de que esta, enquadrando-se como diminuta, nos termos da lei, será explorada pelo ente familiar, sendo decorrência natural do que normalmente se espera que aconteça no mundo real, inclusive, das regras de experiência (NCPC, art. 375).6. O próprio microssistema de direito agrário (Estatuto da Terra; Lei 8.629/1993, entre outros diplomas) entrelaça os conceitos de pequena propriedade, módulo rural e propriedade familiar, havendo uma espécie de presunção de que o pequeno imóvel rural se destinará à exploração direta pelo agricultor e sua família, haja vista que será voltado para garantir sua subsistência.7. Em razão da presunção juris tantum em favor do pequeno proprietário rural, transfere-se ao exequente o encargo de demonstrar que não há exploração familiar da terra, para afastar a hiperproteção da pequena propriedade rural. 8. Recurso especial não provido. (REsp 1408152/PR, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em 1/12/2016).
E, mais:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. IMPENHORABILIDADE. EXPLORAÇÃO FAMILIAR. PRESUNÇÃO JURIS TANTUM. ÔNUS DA PROVA DO EXEQUENTE. DECISÃO MANTIDA.1. Segundo a jurisprudência desta Corte, “em razão da presunção juris tantum em favor do pequeno proprietário rural, transfere-se ao exequente o encargo de demonstrar que não há exploração familiar da terra, para afastar a hiperproteção da pequena propriedade rural” (REsp n. 1.408.152/PR, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 1º/12/2016, DJe 2/2/2017). 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no REsp 1826806/RS, rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, j. em 23/3/2020).
E o posicionamento desta Corte de Justiça não destoa:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. DECISÃO QUE RECONHECEU A IMPENHORABILIDADE DE IMÓVEL. RECURSO DO EXEQUENTE. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. IMÓVEL OFERECIDO EM HIPOTECA. IRRELEVÂNCIA. FATO QUE NÃO IMPORTA RENÚNCIA À IMPENHORABILIDADE. INAPLICABILIDADE DO ART. 3º, V, DA LEI N. 8.009/1990. PREVALÊNCIA DO ART. 5º, XXVI, DA CRFB/88 E ART. 4º, II, “A”, DA LEI N. 8.629/1993. INDÍCIOS DE EXPLORAÇÃO DA GLEBA PARA SUSTENTO DO DEVEDOR E SUA FAMÍLIA. PRESUNÇÃO NÃO DERRUÍDA PELO EXEQUENTE. REQUISITOS CONSTITUCIONAIS PREENCHIDOS. RECURSO DESPROVIDO. (AI n. 5049250-39.2021.8.24.0000, relª. Desª. Janice Goulart Garcia Ubialli, j. em 23/11/2021).
Ainda:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. INTERLOCUTÓRIA QUE RECONHECE A IMPENHORABILIDADE DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. INCONFORMISMO DO EXEQUENTE. DIREITO INTERTEMPORAL. DECISÃO PUBLICADA EM 30-6-21. INCIDÊNCIA DO PERGAMINHO FUX. AVENTADO AFASTAMENTO DA IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL CONSTRITADO. PLEITO INACOLHIDO. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL QUE ENCONTRA CHANCELA NOS ARTS. 5º, INCISO XXVI, DA “CARTA DA PRIMAVERA”, 4º, INCISOS I E II, ALÍNEA A, DA LEI N. 8.629/1993 E 833, INCISO VIII, DO CÓDIGO FUX. CASO CONCRETO QUE ABRAÇA OS REQUISITOS PARA O RECONHECIMENTO DA IMPENHORABILIDADE. COMPROVAÇÃO DA MORADIA E DA VINCULAÇÃO DA DÍVIDA COM A ATIVIDADE PRODUTIVA QUE SOFRERAM MITIGAÇÃO POR PARTE DO ENTENDIMENTO HODIERNO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AREÓPAGO ESTADUAL QUE VEM ENCAMPANDO O RECENTE POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL. IMÓVEL QUE NÃO ALCANÇA SEQUER UM MÓDULO FISCAL DO MUNICÍPIO DE PALMITOS/SC. ÔNUS DA PROVA ACERCA DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE AGRÍCOLA NA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL QUE INCUMBE AO CREDOR. PRESUNÇÃO JURIS TANTUM EM FAVOR DO PEQUENO PROPRIETÁRIO RURAL. DEVER DO EXEQUENTE DE DEMONSTRAR QUE NÃO HÁ EXPLORAÇÃO FAMILIAR DA TERRA, PARA AFASTAR A HIPERPROTEÇÃO DA PEQUENA PROPRIEDADE RURÍCOLA. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTE SODALÍCIO. INTERLOCUTÓRIA PRESERVADA INCÓLUME. REBELDIA IMPROVIDA (AI n. 5041839-42.2021.8.24.0000, rel. Des. José Carlos Carstens Kohler, j. em 26/10/2021).
Igualmente:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. DECISÃO AGRAVADA QUE ACOLHEU A ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DO BEM. INSURGÊNCIA DA PARTE EXEQUENTE. AVENTADA AUSÊNCIA DE PROVAS DE QUE A PROPRIEDADE É TRABALHADA PELA FAMÍLIA. IMÓVEL QUE SE ENQUADRA NO CONCEITO DE PEQUENA PROPRIEDADERURAL PORQUANTO MENOR DO QUE QUATRO MÓDULOS FISCAIS (ART. 4º DA LEI N. 8.623/93). EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE EXPLORAÇÃO DO TERRENO PARA SUSTENTO DA ENTIDADE FAMILIAR (ART. 5º, XXVI, DA CRFB E ART. 833, VIII, CPC). ÔNUS DE DEMONSTRAR A INEXISTÊNCIA DE EXPLORAÇÃO FAMILIAR CAPAZ DE AFASTAR A HIPERPROTEÇÃO DA PEQUENA PROPRIEDADERURAL, ADEMAIS, QUE PERTENCE AO EXEQUENTE. PRESUNÇÃO NÃO DERRUÍDA, NO CASO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE. IMPENHORABILIDADE CONSTATADA. DECISÃO MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DA VERBA FIXADA NA ORIGEM EM ATENÇÃO AO DISPOSTO NO ART. 85, §11, DO CPC. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (AI n. 5013675-04.2020.8.24.0000, rel. Des. Sérgio Izidoro Heil, j. em 28/9/2021).
E, mais:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. TOGADO A QUO QUE RECONHECE A IMPENHORABILIDADE DOS BENS IMÓVEIS RURAIS DE PROPRIEDADE DOS DEVEDORES E REJEITA A ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DOS BENS MÓVEIS. (…) ÔNUS DA PROVA ACERCA DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE AGRÍCOLA NA PEQUENA PROPRIEDADERURAL QUE INCUMBE À CREDORA. PRESUNÇÃO JURIS TANTUM EM FAVOR DO PEQUENO PROPRIETÁRIO RURAL QUE TRANSFERE À EXEQUENTE O ENCARGO DE DEMONSTRAR QUE NÃO HÁ EXPLORAÇÃO FAMILIAR DA TERRA, PARA AFASTAR A HIPERPROTEÇÃO DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. PRECENTEDES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTE AREÓPAGO. (…) (AI n. 4002171-18.2020.8.24.0000, rel. Des. José Carlos Carstens Köhler, j. 09-06-2020, grifei).
No mesmo sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE ACOLHEU A IMPUGNAÇÃO À PENHORA E RECONHECEU A IMPENHORABILIDADE DE PEQUENA PROPRIEDADE RURAL EXPLORADA E HABITADA PELA ENTIDADE FAMILIAR DO DEVEDOR. INSURGÊNCIA DA EXEQUENTE. SUSTENTADA LEGITIMIDADE DA CONSTRIÇÃO SOBRE O IMÓVEL RURAL. TESE REJEITADA. PROPRIEDADE RURAL COM ÁREA NÃO EXCEDENTE A QUATRO MÓDULOS FISCAIS. PEQUENO IMÓVEL RURAL CARACTERIZADO. PROPRIETÁRIOS QUE COMPROVARAM RESIDIR NO LOCAL E A UTILIZAÇÃO DO BEM PARA SUBSISTÊNCIA DA FAMÍLIA. EXEQUENTE QUE NÃO LOGROU ÊXITO EM PRODUZIR PROVA EM CONTRÁRIO. VERIFICAÇÃO, NO CASO CONCRETO, DOS REQUISITOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS PARA IMUNIZAÇÃO DO BEM. CONSONÂNCIA COM O ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. IMPENHORABILIDADE CONFIRMADA. DECISÃO MANTIDA. (AI n. 4000695-76.2019.8.24.0000, de Cunha Porã, rel. Des. Luiz Zanelato, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. em 10/10/2019).
Por derradeiro:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA EM AÇÃO INDENIZATÓRIA. DECISÃO QUE RECONHECEU IMPENHORABILIDADE DE IMÓVEL RURAL E LEVANTOU PENHORA. CABIMENTO DO AGRAVO. ROL DO ART. 1015, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. DECISÃO LIMINAR PROFERIDA POR DESEMBARGADOR NÃO MAIS INTEGRANTE DA CÂMARA. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. DESVINCULAÇÃO DO MAGISTRADO QUE DEIXOU DE INTEGRAR A CÂMARA JULGADORA. PREVENÇÃO DA VAGA E NÃO DO MAGISTRADO. INSURGÊNCIA DA PARTE EXEQUENTE. ALEGAÇÃO DE QUE O EXECUTADO RESIDE EM ENDEREÇO DIVERSO DO IMÓVEL CONSTRITADO E QUE NÃO APRESENTOU PROVAS DE QUE O REFERIDO É INDISPENSÁVEL PARA SUSTENTO PRÓRIO E DA FAMÍLIA. TESES REPELIDAS. SEGUNDO REITERADO ENTENDIMENTO DO STJ NÃO HÁ EXIGÊNCIA DE QUE O IMÓVEL SIRVA DE MORADIA AO DEVEDOR E EM FACE DA HIPERPROTEÇÃO À PEQUENA PROPRIEDADERURAL CONCEDIDA PELO ORDENAMENTO JURÍDICO, HÁ PRESUNÇÃO JURIS TANTUM EM FAVOR DO PROPRIETÁRIO, INCUMBINDO AO CREDOR O ÔNUS DE COMPROVAR DE QUE NÃO HÁ EXPLORAÇÃO FAMILIAR DA TERRA. DECISÃO A QUO  MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. “Em razão da presunção juris tantum em favor do pequeno proprietário rural, transfere-se ao exequente o encargo de demonstrar que não há exploração familiar da terra, para afastar a hiperproteção da pequena propriedade rural. (STJ/REsp 1408152/PR, rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. em 1/12/2016).” (AI n. 5056713-32.2021.8.24.0000, rel. Des. Sílvio Dagoberto Orsatto, j. em 27/10/2022).
Vale mencionar ainda os seguintes julgados: AI n. 4000149-84.2020.8.24.0000, rel. Des. Sérgio Izidoro Heil, j. em 19/05/2020 e AI n. 4014797-06.2019.8.24.0000, rela. Desa. Janice Goulart Garcia Ubialli, j. em 10/9/2019).
Importa registrar, por oportuno, que no momento do ajuizamento da ação de execução de título extrajudicial, a própria cooperativa agravada, quando da qualificação dos executados, indicou como local para citação o endereço do imóvel no qual se discute a impenhorabilidade.
De mais a mais, determinada a citação, cujo mandado possui o endereço do imóvel ora discutido, lá foram encontrados os executados, o que leva a crer que o bem é utilizado para residência familiar e que de lá retiram parcela de seu sustento, conforme certidão do Oficial de Justiça, o qual certifica que:
(…) em cumprimento ao mandado extraído dos autos mencionados, compareci no local indicado e, após as formalidades legais, procedi à citação de A. A. M., do inteiro teor deste e das peças processuais que o acompanham, o qual aceitou a contrafé que ofereci, sem exarar sua assinatura.
Certifico que, em cumprimento ao mandado extraído dos autos mencionados, compareci no local indicado e, após as formalidades legais, procedi à citação de M. V. T. M., do inteiro teor deste e das peças processuais que o acompanham, a qual aceitou a contrafé que ofereci, sem exarar sua assinatura.
Certifico que, em cumprimento ao mandado extraído dos autos mencionados, compareci no local indicado e, após as formalidades legais, procedi à citação de R. L. M., do inteiro teor deste e das peças processuais que o acompanham, o qual aceitou a contrafé que ofereci, sem exarar sua assinatura. Dou fé.
Portanto, ainda que o executado R. L. M. exerça o cargo de vereador no Município de São José do Cerrito, como sustenta a parte agravada em contrarrazões, por ora as provas contidas nos autos sustentam que a propriedade é inferior a 4 módulos fiscais, ou seja, considerada pequena propriedaderural, e é também utilizada como moradia dos executados A. A. M., M. V. T. M. e R. L. M., pois lá foram encontrados para citação, preenchendo, pois, os requisitos ensejadores da impenhorabilidade, ao menos até que prova em contrário seja produzida pela agravada.
 Diante dessas considerações, comporta provimento o presente recurso, confirmando-se na íntegra a decisão que deferiu a medida suspensiva (Evento 23 – DESPADEC1) e, consequentemente, a reforma da interlocutória proferida pelo juízo de primeiro grau.
Parte Dispositiva
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do Agravo de Instrumento e dar-lhe provimento, nos termos da fundamentação. Comunique-se ao juízo a quo.

Documento eletrônico assinado por SILVIO DAGOBERTO ORSATTO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3672669v23 e do código CRC c9737fc7.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): SILVIO DAGOBERTO ORSATTOData e Hora: 14/12/2023, às 17:42:58

Agravo de Instrumento Nº 5071915-15.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador SILVIO DAGOBERTO ORSATTO

AGRAVANTE: ANTONIO ADAIR MEDEIROS AGRAVANTE: MARIA VALQUIRIA TILL MEDEIROS AGRAVANTE: ROBSON LUHAN MEDEIROS AGRAVADO: COPERMAP – COOPERATIVA MULTIPLA DE AGRICULTURA E PECUARIA

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. DECISÃO QUE MANTEVE A PENHORA INCIDENTE SOBRE O IMÓVEL CONSIDERADO PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. CABIMENTO DO AGRAVO. ROL DO ART. 1.015, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. INSURGÊNCIA DOS EXECUTADOS. DEFENDEM A IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL RURAL EM RAZÃO DA UTILIZAÇÃO DA TERRA PARA SUBSISTÊNCIA. TESE ACOLHIDA. PROPRIEDADE INFERIOR A QUATRO MÓDULOS FISCAIS. REQUISITOS DA IMPENHORABILIDADE PREENCHIDOS. ÔNUS DA CONTRAPROVA QUE INCUMBE AO CREDOR. FATOS NÃO DERRUÍDOS PELO EXEQUENTE. CITAÇÃO DE TODOS OS EXECUTADOS NA REFERIDA PROPRIEDADE. INDÍCIOS RELEVANTES QUE CARACTERIZAM A HABITAÇÃO E PROVEITO ECONÔMICO DA ÁREA. ALEGAÇÃO DE QUE UM DOS EXECUTADOS EXERCE CARGO DE VEREADOR. FATO QUE NÃO AFASTA A EXPLORAÇÃO FAMILIAR DOS DEMAIS COPROPRIETÁRIOS. DECISÃO A QUO REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
“A pequena propriedade rural trabalhada pela entidade familiar é impenhorável, mesmo quando oferecida em garantia hipotecária pelos respectivos proprietários. Precedentes. Segundo a jurisprudência desta corte, “em razão da presunção juris tantum em favor do pequeno proprietário rural, transfere-se ao exequente o encargo de demonstrar que não há exploração familiar da terra, para afastar a hiperproteção da pequena propriedaderural” (resp n. 1.408.152/pr, relator ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 1º/12/2016, dje 2/2/2017). (AgInt no AREsp 1677976/SP, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, DJe 03/11/2022).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, conhecer do Agravo de Instrumento e dar-lhe provimento, nos termos da fundamentação. Comunique-se ao juízo a quo, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 14 de dezembro de 2023.

Documento eletrônico assinado por SILVIO DAGOBERTO ORSATTO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3672670v25 e do código CRC 0fe0be2b.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): SILVIO DAGOBERTO ORSATTOData e Hora: 14/12/2023, às 17:42:58

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 14/12/2023

Agravo de Instrumento Nº 5071915-15.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador SILVIO DAGOBERTO ORSATTO

PRESIDENTE: Desembargador FLAVIO ANDRE PAZ DE BRUM

PROCURADOR(A): MONIKA PABST
AGRAVANTE: ANTONIO ADAIR MEDEIROS ADVOGADO(A): MARIO CÉSAR PENTEADO (OAB SC010947) ADVOGADO(A): MARCIU ELIAS FRIEDRICH (OAB SC014009) AGRAVANTE: MARIA VALQUIRIA TILL MEDEIROS ADVOGADO(A): MARIO CÉSAR PENTEADO (OAB SC010947) ADVOGADO(A): MARCIU ELIAS FRIEDRICH (OAB SC014009) AGRAVANTE: ROBSON LUHAN MEDEIROS ADVOGADO(A): MARIO CÉSAR PENTEADO (OAB SC010947) ADVOGADO(A): MARCIU ELIAS FRIEDRICH (OAB SC014009) AGRAVADO: COPERMAP – COOPERATIVA MULTIPLA DE AGRICULTURA E PECUARIA ADVOGADO(A): PEDRO ERNESTO BEBBER (OAB SC032830)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual do dia 14/12/2023, na sequência 225, disponibilizada no DJe de 27/11/2023.
Certifico que a 1ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 1ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO AGRAVO DE INSTRUMENTO E DAR-LHE PROVIMENTO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO. COMUNIQUE-SE AO JUÍZO A QUO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador SILVIO DAGOBERTO ORSATTO
Votante: Desembargador SILVIO DAGOBERTO ORSATTOVotante: Desembargador EDIR JOSIAS SILVEIRA BECKVotante: Desembargador RAULINO JACÓ BRUNING
HUMBERTO RICARDO CORSOSecretário

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTESRessalva – Gab. 02 – 1ª Câmara de Direito Civil – Desembargador EDIR JOSIAS SILVEIRA BECK.Há dissenso junto ao Superior Tribunal de Justiça quanto à presunção que leva à impenhorabilidade do pequeno imóvel rural, sendo de se reconhecer de qualquer sorte que ao credor muito mais difícil a prova pertinente. No caso em exame o devedor “não moveu uma palha” no sentido de comprovar a exploração familiar da gleba, limitando-se a afirmá-la.O que há de certo até aqui é que a parte executada não pagou o que devia. Feitas tais ressalvas, todavia, acompanho o mui digno Relator. 

Fonte: TJSC

Imagem Freepik

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