Ligação de energia elétrica em área de uso consolidado

Ligação de energia elétrica em área de uso consolidado. TJSC afasta a aplicação de Lei de São Francisco do Sul que autoriza a ligação de energia elétrica em área de uso consolidado. A decisão não é definitiva, já que o processo depende de uma solução final do mérito.

Ligação de energia elétrica em área de uso consolidado

A Lei Ordinária nº 2070/2018, do Município de São Francisco do Sul, dispõe que:

Art. 1º Ficam permitidas as ligações de energia elétrica pela concessionária da rede pública, Centrais Elétricas de Santa Catarina S.A. – CELESC, nas edificações que não tenham o competente alvará de construção e/ou habite-se fornecido pela Prefeitura Municipal de São Francisco do Sul, desde que:

I – a edificação não esteja localizada em Área de Preservação Permanente – APP, exceto se comprovada que se trata de área urbana ou rural consolidada, com comprovação fotográfica com data anterior a esta Lei.

II – a edificação não esteja localizada em área classificada pela Defesa Civil como de risco alto, risco muito alto ou de exclusão;

III – a edificação esteja cadastrada na Prefeitura para a cobrança de Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU, ou possua fatura de água, ou inscrição no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA.

IV – respeitem as regras estabelecidas pela concessionária.

LEI Nº 2070/2018 do Município de São Francisco do Sul(SC)

Em sede de ação civil pública, promovida pelo Ministério Público, o Tribunal de Justiça de Santa manteve a decisão de primeira instância que deferiu liminar no sentido de determinar que a Celesc não realize novas ligações de energia elétrica, sem prévia apresentação de alvará de construção ou de habite-se; e que o Município de São Francisco de Sul se abstenha de emitir qualquer documento à Celesc que autorize a ligação de luz elétrica com respaldo na Lei Municipal 2070/2018.

Para o Tribunal, a par de uma possível inconstitucionalidade, “a lei em alusão admite a prestação do serviço inclusive a edificações situadas em área de preservação permanente, desde que se comprove, por meio de fotografias, a inserção em área urbana ou rural consolidada. Mencione-se ainda que a lei sequer estabelece parâmetros para se aferir a caracterização de área urbana ou rural consolidada, permitindo, assim, larga margem de discricionariedade à Administração“. (Excerto do Acórdão)

A decisão não é definitiva, já que o processo ainda depende de uma solução final do mérito – talvez haja luz no fim do túnel!

Abaixo segue a íntegra do acórdão.

Jurisprudência

ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO

Agravo de Instrumento Nº 5046429-96.2020.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA

AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE SÃOFRANCISCO DO SUL/SC AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo por instrumento interposto pelo Município de SãoFrancisco do Sul contra decisão que, em ação civil pública proposta pelo Ministério Público em face da municipalidade e da Celesc (autos n. 5003427-87.2020.8.24.0061), deferiu o pedido liminar a fim de impedir a efetivação de novas ligações de energia elétrica com base na Lei Municipal nº 2.070/2018, que permite a concessão do serviço a edificações construídas sem licença (alvará e “habite-se”), inclusive a imóveis situados em área de preservação permanente, desde que inseridos em área urbana ou rural consolidada.
A decisão agravada foi prolatada nos seguintes termos (evento 10 do processo na origem): 
‘Trata-se de ação civil pública, por meio da qual o Ministério Público, liminarmente, requer “que a CELESC se abstenha de realizar novas ligações de energia elétrica, sem prévia apresentação, pelo solicitante, de alvará de construção ou de habite-se, sob pena de multa de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) por ocorrência” e “que o MUNICÍPIO DE SÃOFRANCISCO DO SUL se abstenha de emitir qualquer documento à Concessionária ré CELESC que autorize a ligação de luz elétrica com respaldo na Lei Municipal 2070/2018, sob pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por ocorrência”, tudo sob o fundamento da ilegalidade da LM nº 2.070/18.
No evento 3, foi determinada a intimação dos réus para se manifestarem.
A Municipalidade se manifestou no evento 7. Em suma, alegou que ‘Tal solicitação deveria ser endereçada à Câmara de Vereadores, por ter sido de sua iniciativa a Lei Municipal nº 2070/2018 e por ser de sua responsabilidade a rejeição do veto emanado pelo Prefeito Municipal’ e que ‘qualquer pedido que tenha como objetivo a suspensão de vigência de lei deve ser requerida em instrumento judicial próprio para tanto’.
A Celesc se manifestou no evento 8. Em suma, alegou que ‘já efetiva todos os procedimentos visando coibir ações que contribuam com a ocupação irregular de áreas de preservação permanente’.
Relatei. Decido.
Sustenta a Municipalidade que ‘qualquer pedido que tenha como objetivo a suspensão de vigência de lei deve ser requerida em instrumento judicial próprio para tanto’. Embora a tese não tenha sido mais desenvolvida, recebo a alegação como preliminar de inadequação da via eleita. Todavia, entendo, ao menos em sede de cognição sumária, que no presente caso a inconstitucionalidade figura como causa de pedir da demanda, e não como pedido. Em outras palavras: o Ministério Público não pleiteia provimento jurisdicional que retire a norma do ordenamento jurídico, mas sim provimento jurisdicional que determine à parte ré que se abstenha de praticar atos administrativos pretensamente ilegais, com base em lei que a parte autora reputa inconstitucional. Trata-se, portanto, de típico caso de controle de validade dos atos administrativos, o que pode se dar em caráter preventivo e mediante ação coletiva – medida que é até salutar, por evitar o ajuizamento de uma ação individual para cada caso concreto em que venham a ser praticados atos com base na norma.
A Municipalidade alega, ainda, que a ‘solicitação deveria ser endereçada à Câmara de Vereadores’. Todavia, além da ausência de personalidade jurídica da Câmara de Vereadores, é de se observar que, como dito acima, a presente ação não busca a declaração de inconstitucionalidade da lei, mas sim a não prática de atos administrativos com base nela, o que legitima que a pretensão seja deduzida em face do destinatário, e não do emissor, da norma.


Assim dispõe a legislação em discussão:
Art. 1º Ficam permitidas as ligações de energia elétrica pela concessionária da rede pública, Centrais Elétricas de Santa Catarina S.A. – CELESC, nas edificações que não tenham o competente alvará de construção e/ou habite-se fornecido pela Prefeitura Municipal de SãoFrancisco do Sul, desde que:I – a edificação não esteja localizada em Área de Preservação Permanente – APP, exceto se comprovada que se trata de área urbana ou rural consolidada, com comprovação fotográfica com data anterior a esta Lei.II – a edificação não esteja localizada em área classificada pela Defesa Civil como de risco alto, risco muito alto ou de exclusão;III – a edificação esteja cadastrada na Prefeitura para a cobrança de Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU, ou possua fatura de água, ou inscrição no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA.IV – respeitem as regras estabelecidas pela concessionária.
Em especial, bate-se o Ministério Público contra o fato de a lei admitir a ligação à rede elétrica de imóvel sem alvará de construção ou habite-se.
Verifico que há plausibilidade na alegação de inconstitucionalidade. A competência para legislar sobre energia é da União, nos termos do artigo 22, IV, da Constituição Federal, acompanhando sua atribuição para explorar os “serviços e instalações de energia elétrica” (art. 21, XII, b). Logo, ao legislar sobre o tema, o legislador municipal avançou sobre competência legislativa alheia, além de interferir na relação contratual mantida entre a concessionária e o poder concedente.
Em caso semelhante, assim decidiu o STF:
Ementa: CONSTITUCIONAL. LEI ESTADUAL 12.635/07, DE SÃO PAULO. POSTES DE SUSTENTAÇÃO DA REDE ELÉTRICA. OBRIGAÇÃO DE REMOÇÃO GRATUITA PELAS CONCESSIONÁRIAS EM PROVEITO DE CONVENIÊNCIAS PESSOAIS DOS PROPRIETÁRIOS DE TERRENOS. ENCARGOS EXTRAORDINÁRIOS NÃO PREVISTOS NOS CONTRATOS DE CONCESSÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. RELEVÂNCIA JURÍDICA DA TESE DE USURPAÇÃO DAS COMPETÊNCIAS FEDERAIS PARA DISPOR SOBRE O TEMA. 1. Tendo em vista (a) a simplicidade da questão de direito sob exame; (b) a exaustividade das manifestações aportadas aos autos; e (c) a baixa utilidade da conversão do rito inicial adotado para o presente caso, a ação comporta julgamento imediato do mérito. Medida sufragada pelo Plenário em questão de ordem. 2. As competências para legislar sobre energia elétrica e para definir os termos da exploração do serviço de seu fornecimento, inclusive sob regime de concessão, cabem privativamente à União, nos termos dos art. 21, XII, “b”; 22, IV e 175 da Constituição. Precedentes. 3. Ao criar, para as empresas que exploram o serviço de fornecimento de energia elétrica no Estado de São Paulo, obrigação significativamente onerosa, a ser prestada em hipóteses de conteúdo vago (“que estejam causando transtornos ou impedimentos”) para o proveito de interesses individuais dos proprietários de terrenos, o art. 2º da Lei estadual 12.635/07 imiscuiu-se indevidamente nos termos da relação contratual estabelecida entre o poder federal e as concessionárias. 4. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.(ADI 4925, Relator(a): TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 12/02/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-045  DIVULG 09-03-2015  PUBLIC 10-03-2015) (grifou-se)
Portanto, sem prejuízo da oportuna análise das demais alegações da inicial, entendo que tal constatação já é suficiente para o deferimento da medida pleiteada.
Por sua vez, o risco de dano decorre da irreversibilidade de eventuais ligações à rede elétrica que venham a ser efetuadas com base na lei em questão, além do estímulo à ocupação desordenada e desenfreada do solo, com possíveis danos ao meio ambiente e à ordem urbanística.
Por fim, observo que, em sua manifestação, a Celesc não se opôs à medida pleiteada e inclusive informou já proceder nos moldes defendidos pelo Ministério Público.
Ante o exposto, defiro a tutela de urgência, a fim de:
a) determinar que a Celesc se abstenha de realizar novas ligações de energia elétrica, sem prévia apresentação, pelo solicitante, de alvará de construção ou de habite-se; e 
b) que o Município de São Francisco de Sul se abstenha de emitir qualquer documento à Concessionária ré Celesc que autorize a ligação de luz elétrica com respaldo na Lei Municipal 2070/2018.
Por ora, deixo de fixar multa diária, considerando a) que não há motivos para presumir que haverá desobediência aos comandos ora proferidos e b) que a parte autora já tem a sua disposição os instrumentos processuais para promover a responsabilidade civil, criminal e administrativa das autoridades porventura desobedientes.”
Em suas razões recursais, suscitou a inadequação da via eleita, alegando que a pretensão de impedir, de forma geral, a aplicação da Lei Municipal nº 2.070/2018 equivale a controle abstrato de constitucionalidade, não podendo ser veiculada em ação civil pública. No mérito, sustentou a possibilidade de fornecimento de energia elétrica a edificações irregulares, por se tratar de serviço essencial, ressaltando que em áreas consolidadas inexistiria justificativa ambiental para negar a prestação do serviço. Citou decisões deste Tribunal de Justiça que estariam alinhadas à sua pretensão. Requereu a concessão de efeito suspensivo, e, ao final, o provimento do recurso. 
Este Relator indeferiu o efeito suspensivo almejado (evento 3).
Foram apresentadas contrarrazões (evento 14).
O Procurador de Justiça Carlos Alberto de Carvalho Rosa lavrou parecer, opinando “pelo conhecimento e desprovimento do agravo de instrumento, mantendo-se a decisão interlocutória que indeferiu a pretendida tutela provisória de urgência, por seus próprios e jurídicos fundamentos”.
É o relatório. 

VOTO

Conheço do recurso, porquanto satisfeitos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade.
Razão não assiste à parte recorrente.
Os pressupostos para a concessão de tutela de urgência estão previstos no art. 300 do CPC/2015, nos seguintes termos: “Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”
Como já adiantado na decisão que indeferiu o efeito suspensivo, tais requisitos não se encontram satisfeitos de forma concomitante na hipótese dos autos.
Numa análise perfunctória, típica do momento processual, observa-se a plausibilidade das alegações e a urgência pendem em favor da pretensão do Ministério Público.
1. Do cabimento da ação civil pública:
Suscitou a parte agravante a inadequação da via eleita, alegando que a pretensão de impedir, de forma geral, a aplicação da Lei Municipal nº 2.070/2018 equivale a controle abstrato de constitucionalidade, não podendo ser veiculada em ação civil pública.
A preliminar merece ser rejeitada.
Da leitura da petição inicial, verifica-se que a pretensão deduzida na ação civil pública visa impedir o fornecimento de energia elétrica a edificações irregulares no Município de SãoFrancisco do Sul, inclusive nas hipóteses previstas na Lei Municipal nº 2.070/2018.
Para obter a tutela almejada, postula o Parquet a declaração incidental de inconstitucionalidade da lei municipal em destaque.
Assim, como bem ressaltou o magistrado ao proferir a decisão recorrida, a inconstitucionalidade da norma não representa o pedido, mas causa de pedir.
Trata-se, pois, de controle difuso de constitucionalidade, podendo ser pleiteado em ação civil pública.
Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
“PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEI MUNICIPAL. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. CAUSA DE PEDIR. CABIMENTO. […] 2. De acordo com a jurisprudência desta Corte, ‘a inconstitucionalidade de determinada lei pode ser alegada em ação civil pública, desde que a título de causa de pedir – e não de pedido -‘, como no caso em análise, pois, nessa hipótese, o controle de constitucionalidade terá caráter incidental (REsp 1.569.401/CE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/03/2016, DJe 15/03/2016). 3. Hipótese em que o Parquet estadual questiona a constitucionalidade da Lei Municipal n. 5.998/2006 – que dispõe sobre a desafetação de áreas de uso comum do povo e institucionais de loteamento -, pela via difusa, objetivando a nulidade de eventuais negócios jurídicos que envolvam a transferência da posse ou propriedade a particulares, bem como a condenação do município às obrigações de fazer, consistentes na desocupação da área e reposição dos danos ambientais porventura causados. 4. A ação civil pública, no caso, não combate diretamente a inconstitucionalidade da lei municipal, mas os efeitos concretos e imediatos decorrentes desse ato normativo – impactos no planejamento urbano da cidade e probabilidade de riscos irreversíveis -, sob o prisma ambiental e urbanístico. 5. Agravo interno desprovido.” (STJ, AgInt no REsp 1345995/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/09/2019, DJe 25/09/2019)
Na mesma linha, citem-se as seguintes decisões desta Corte Estadual:
“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REGULAMENTAÇÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE DE MOTORISTA PRIVADO POR APLICATIVO DO MUNICÍPIO DE SÃO LOURENÇO DO OESTE. INDEFERIMENTO DA INICIAL,1) INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI MUNICIPAL EM ACP. POSSIBILIDADE EM CARÁTER INCIDENTAL. SENTENÇA CASSADA, NO PONTO. RETORNO DOS AUTOS AO PRIMEIRO GRAU PARA REGULAR PROCESSAMENTO.’A jurisprudência do STJ entende possível a declaração incidental de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos, em sede de ação civil pública, quando a controvérsia constitucional figurar como causa de pedir ou questão prejudicial indispensável à resolução do pedido principal’. (STJ, AgInt no REsp 1364679/MG, rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, j. 19-2-2019)2) MATÉRIA TRIBUTÁRIA. AUSÊNCIA DE INTERESSE SOCIAL QUALIFICADO. DIREITO INDIVIDUAL HOMOGÊNEO DISPONÍVEL. INVIABILIDADE DO MANEJO DE ACP. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DO STJ.’Há vedação expressa no art. 1º, parágrafo único, da Lei 7.347/1985 à veiculação de pretensão pertinente à matéria tributária em ação civil pública’. (STJ, AgInt REsp n. 1502258/SP, rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, j. 23-9-2019)RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA EM REEXAME NECESSÁRIO.” (TJSC, Apelação n. 5000152-18.2020.8.24.0066, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, Primeira Câmara de Direito Público, j. 20-04-2021).
“APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTAL DOS ARTS. ARTS. 4º, II, 12, 13, 14 E 15 DA LEI ESTADUAL N. 14.661/2009. PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE QUE NÃO É PRINCIPAL E SIM INCIDENTAL. DECLARAÇÃO QUE SE CONFIGURA COMO CAUSA DE PEDIR. POSSIBILIDADE. INCONSTITUCIONALIDADE NÃO EVIDENCIADA. OMISSÃO NA FISCALIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE QUE SE IMPÕE A TODOS OS ENTES DA ADMINISTRAÇÃO. LEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO DE SANTO AMARO DA IMPERATRIZ PARA RESPONDER À DEMANDA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA PELA RECUPERAÇÃO DO LOCAL DEGRADADO, COM EXECUÇÃO SUBSIDIÁRIA.   RECURSO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E PROVIDO.    RECURSO INTERPOSTO PELA FATMA PARCIALMENTE CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO NO QUE DIZ RESPEITO A PARTE CONHECIDA.” (TJSC, Apelação Cível n. 0001418-07.2010.8.24.0057, de Santo Amaro da Imperatriz, rel. Artur Jenichen Filho, Quinta Câmara de Direito Público, j. 28-11-2019).
Portanto, a prefacial merece ser rechaçada.
2. Do fornecimento de energia elétrica a edificações irregulares e da tutela de urgência:
No mérito, a parte agravante sustentou a possibilidade de fornecimento de energia elétrica a edificações irregulares, por se tratar de serviço essencial, ressaltando que em áreas consolidadas inexistiria justificativa ambiental para negar a prestação do serviço. Citou decisões deste Tribunal de Justiça que estariam alinhadas à sua pretensão.
Predomina no TJSC entendimento no sentido de que os serviços de abastecimento de água e energia elétrica, em regra, não devem ser executados em favor de edificações irregulares. Nesse sentido, citem-se as seguintes decisões:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO.   AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER.   PLEITO PARA INSTALAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA E DE ÁGUA EM EDIFICAÇÃO CLANDESTINA.   DECISÃO INDEFERINDO A TUTELA ANTECIPADA.   INSURGÊNCIA DA AUTORA.   PRETEXTADOS SERVIÇOS ESSENCIAIS. CARÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO, ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO OU HABITE-SE EXPEDIDO PELA PREFEITURA MUNICIPAL PARA O IMÓVEL IRREGULAR.   PRECEDENTES.’Em princípio, não é ilegal nem indevida a recusa da concessionária de ligar à sua rede de energia elétrica edificação clandestina realizada sem o necessário alvará de licença do Município, em Área de Preservação Permanente e também porque a empresa restou proibida judicialmente de efetuar a instalação da energia elétrica em imóveis irregulares. A não comprovação da regularidade da construção e da localização do imóvel em área residencial consolidada em local de preservação permanente impede a concessão de segurança para fins de fornecimento de energia elétrica (Des. Jaime Ramos Público) […]’ (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4017557-93.2017.8.24.0000, de Jaguaruna, rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, Primeira Câmara de Direito Público, j. em 19/03/2019).RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4010366-26.2019.8.24.0000, de São Lourenço do Oeste, rel. Luiz Fernando Boller, Primeira Câmara de Direito Público, j. 11-08-2020).
“FORNECIMENTO DE ÁGUA. LIGAÇÃO NEGADA PELA CONCESSIONÁRIA. EXORDIAL DESACOMPANHADA DE ALVARÁ OU QUALQUER OUTRO MEIO APTO A COMPROVAR A REGULARIDADE DA CONSTRUÇÃO. ÔNUS DA PROVA QUE INCUMBE AO AUTOR QUANTO AO FATO CONSTITUTIVO DO SEU DIREITO (ART. 373, I, DO CPC/2015). INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO CARACTERIZADOR DO DANO MORAL. RECURSO DESPROVIDO.” (TJSC, Apelação Cível n. 0300621-44.2018.8.24.0067, de São Miguel do Oeste, rel. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, Primeira Câmara de Direito Público, j. 12-05-2020).
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR. PRETENSA INSTALAÇÃO E FORNECIMENTO DE ÁGUA EM RESIDÊNCIA. INSURGÊNCIA ANTE AO ATO DA CONCESSIONÁRIA QUE NEGOU O SERVIÇO. INDEFERIMENTO DO PEDIDO LIMINAR. ÁREA CONSIDERADA NOVA. AUSÊNCIA DE ALVARÁ E DE OUTRAS PROVAS DA REGULARIDADE DA CONSTRUÇÃO. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA MEDIDA NÃO VERIFICADOS. DESPROVIMENTO DO RECURSO.  Não comprovada a regularidade da ocupação, não se pode compelir a concessionária dos serviços de água e esgoto a realizar a ligação da rede em edificação clandestina. A existência de outras edificações em situação semelhante e destinatárias do serviço não é argumento idôneo para tolerar a irregularidade da construção, pois os abusos e as violações da lei devem ser coibidos, não imitados.” (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4001651-29.2018.8.24.0000, de Tubarão, rel. Pedro Manoel Abreu, Primeira Câmara de Direito Público, j. 18-09-2018).
“ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. AÇÃO COMINATÓRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. INEXISTÊNCIA DE LAUDO TÉCNICO DEMONSTRANDO QUE O IMÓVEL NÃO SE ENCONTRA LOCALIZADO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP). OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO. ADEMAIS, AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE QUE A CONSTRUÇÃO É REGULAR, SOBRETUDO PELA AUSÊNCIA DE ALVARÁ OU DE HABITE-SE. LEGALIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.’Em princípio, não é ilegal nem indevida a recusa da concessionária de ligar à sua rede de energia elétrica edificação clandestina realizada sem o necessário alvará de licença do Município, em Área de Preservação Permanente e também porque a empresa restou proibida judicialmente de efetuar a instalação da energia elétrica em imóveis irregulares. A não comprovação da regularidade da construção e da localização do imóvel em área residencial consolidada em local de preservação permanente impede a concessão de segurança para fins de fornecimento de energia elétrica’ (TJSC, AC. em MS. n. 2013.002235-0, rel. Des. Jaime Ramos, j. 13.06.13).” (TJSC, Apelação n. 0300076-59.2016.8.24.0029, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Francisco José Rodrigues de Oliveira Neto, Segunda Câmara de Direito Público, j. 09-02-2021).
“SERVIÇOS PÚBLICOS. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER.  PRETENDIDA LIGAÇÃO À REDE DE DISTRIBUIÇÃO E PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO. INEXISTÊNCIA DE ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO LEGITIMANDO A OCUPAÇÃO DO IMÓVEL. LOTEAMENTO IRREGULAR, SEM AUTORIZAÇÃO DOS ÓRGÃOS COMPETENTES E SEM LICENCIAMENTO AMBIENTAL. CENÁRIO FÁTICO-PROBATÓRIO A DEMONSTRAR A CLANDESTINIDADE DA OCUPAÇÃO. NEGATIVA LEGÍTIMA DA CONCESSIONÁRIA. PRECEDENTES DESTA CORTE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJSC, Apelação n. 0303109-80.2017.8.24.0010, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Ronei Danielli, Terceira Câmara de Direito Público, j. 15-12-2020).
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. SAMAE. CELESC. PEDIDOS DE FORNECIMENTO DE ÁGUA E DE ENERGIA ELÉTRICA. LOTEAMENTO IRREGULAR (CLANDESTINO). FALTA DE VEROSSIMILHANÇA DO ALEGADO PELOS AGRAVANTES. AUSÊNCIA DE ALVARÁ E DE PROVA DA REGULARIDADE DA CONSTRUÇÃO. MANUTENÇÃO DO DECISUM REVOGATÓRIO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.   ‘Pelos elementos constantes do instrumento de agravo conclui-se que falta verossimilhança ao alegado pelos agravantes, a começar pela própria localização do imóvel, circunstância que afasta a ‘probabilidade do direito’ para fim de concessão de tutela antecipada, na esteira do art. 300, caput, do Código de Processo Civil.De mais a mais, registre-se que o só fato de tratar-se de serviços essenciais (água e energia elétrica) não pode servir de salvo conduto para, como referem os agravantes, garantir que sejam eles fornecidos de qualquer modo, em qualquer situação.’ (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0033592-36.2016.8.24.0000, de Blumenau, rel. Des. João Henrique Blasi, Segunda Câmara de Direito Público, j. 6-12-2016).  ‘A existência de outras edificações em situação semelhante e destinatárias do serviço não é argumento idôneo para tolerar a irregularidade da construção, pois os abusos e as violações da lei devem ser coibidos, não imitados.’ (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0025491-10.2016.8.24.0000, de Blumenau, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, Terceira Câmara de Direito Público, j. 13-06-2017).  RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0033527-41.2016.8.24.0000, de Blumenau, rel. Vera Lúcia Ferreira Copetti, Quarta Câmara de Direito Público, j. 07-02-2019).
“AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA RÉ (CONCESSIONÁRIA).   CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO.   ALEGAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL, POR POSSÍVEL INTERESSE DA UNIÃO E DO ICMBIO. RELAÇÃO EMINENTEMENTE CONSUMERISTA.   INTIMAÇÃO DO MUNICÍPIO. INEXISTÊNCIA DE DISCUSSÃO SOBRE QUESTÕES URBANÍSTICAS. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NÃO CONFIGURADO.   SUSTENTADA A AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. PRELIMINARES AFASTADAS. PRECEDENTES DESTE SODALÍCIO.   MÉRITO. IMÓVEL SITUADO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. PARCELAMENTO DO SOLO CLANDESTINO OU EM ÁREA DE OCUPAÇÃO IRREGULAR. NECESSIDADE DE APRESENTAÇÃO DE ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO OU HABITE-SE. ENTENDIMENTO DESTA CORTE DE JUSTIÇA. DISPENSA EM CARÁTER EXCEPCIONAL. HIPÓTESE NÃO VERIFICADA. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS INICIAIS QUE SE IMPÕE. SENTENÇA REFORMADA.   RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.” (TJSC, Apelação Cível n. 0301042-39.2016.8.24.0282, de Jaguaruna, rel. Vilson Fontana, Quinta Câmara de Direito Público, j. 06-08-2020).
Esse entendimento está assentado na necessidade de conter a formação e consolidação de novos assentamentos irregulares, além de, em determinados casos, estar amparado em ordens judiciais emanadas de ações civis públicas propostas pelo Ministério Público (Federal e Estadual).
Em contrapartida, a jurisprudência do TJSC admite, excepcionalmente, o fornecimento desses serviços quando, no caso concreto, prevalecer o princípio da dignidade da pessoa humana e da isonomia, especialmente em casos nos quais a edificação está inserida em área urbana consolidada. É o que se infere dos seguintes julgados:
“APELAÇÃO CÍVEL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ALEGADA INSERÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP). ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO INDEFERIDO EM RAZÃO DA PROXIMIDADE AO BANHADO EXISTENTE. CONDIÇÕES TÉCNICAS DE SEGURANÇA. ÁREA URBANA CONSOLIDADA. PROVA ROBUSTA. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA ÀS RESIDÊNCIAS ADJACENTES. LAUDO TÉCNICO, ELABORADO POR ENGENHEIRO FLORESTAL, CONCLUSIVO PELA CONSOLIDAÇÃO DO LOCAL E QUE APONTA PARA A NÃO INSERÇÃO DA RESIDÊNCIA DOS AUTORES EM APP. LAUDO DE ENGENHEIRO ELETRICISTA QUE INDICA A OBEDIÊNCIA AOS PADRÕES TÉCNICOS DA CELESC. MERAS ALEGAÇÕES DE RISCO À SEGURANÇA E EFETIVIDADE DA REDE, SEM QUALQUER COMPROVAÇÃO. APONTA PARA CONDIÇÕES TÉCNICAS DE SEGURANÇA E EFETIVIDADE ENERGIA ELÉTRICA E MORADIA. DIREITOS INDISPONÍVEIS. PREVALÊNCIA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. LIGAÇÃO E FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA DEVIDOS. SENTENÇA MANTIDA.  ‘Não se deve permitir o fornecimento de serviços públicos em área de preservação, que não admitirá na mesma medida edificações. Isso não vale para áreas urbanas consolidadas, as quais perderam o sentido natural pretérito. Prepondera a proporcionalidade, valorizando-se o direito que no caso concreto traz maior envergadura: a dignidade da pessoa (em detrimento de um resguardo ambiental que ficou prejudicado com a situação de fato hoje existente). Multiplicidade de precedentes deste Tribunal de Justiça. Remessa desprovida.’ (TJSC, Remessa Necessária Cível n. 0302016-89.2017.8.24.0040, de Laguna, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. em 30/01/2020, grifei).  RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJSC, Apelação Cível n. 0301398-61.2015.8.24.0058, de São Bento do Sul, rel. Artur Jenichen Filho, Quinta Câmara de Direito Público, j. 29-09-2020).
“Agravo de instrumento. antecipação dos efeitos da tutela. celesc. fornecimento de energia elétrica. negativa da concessionária. alegação de que o imóvel é irregular. ausência de comprovação de que se encontra em área de preservação permanente – app. ocupação consolidada. família em situação de precariedade. moradia de três adultos e cinco crianças. necessidade de energia elétrica apontada pela assistência social do município. dignidade da pessoa humana. atendimento aos direitos da criança e do adolescente. desenvolvimento sadio e harmonioso.O fornecimento de energia elétrica, que é serviço público essencial e de utilidade pública, relaciona-se, diretamente, com a dignidade da pessoa humana, mas cede espaço, em regra, em favor do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado quando a pretensa unidade consumidora estiver em localidade de proteção ambiental. Contudo, em se tratando de área rural ou urbana consolidada, porquanto já mitigada, faticamente, a proteção ambiental, não há prevalecer o óbice jurídico, com a consequente necessidade de ligação da unidade à rede de energia elétrica (TJSC, Des. Henry Petry Júnior).situação extraordinária. pandemia. covid-19. serviço essencial, especialmente para viabilizar o confinamento da família e a manutenção dos hábitos de higiene indispensáveis para se evitar o contágio. possibilidade de reversibilidade da medida. modificação da decisão. deferimento do pedido. recurso provido.” (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5008741-03.2020.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Pedro Manoel Abreu, Primeira Câmara de Direito Público, j. 07-07-2020).
Assim, a solução a ser adotada pressupõe exame dos elementos fáticos a fim de verificar a caracterização ou não do local como área consolidada. É dizer, a resolução da lide depende da interpretação dos fatos com o objetivo de permitir o exato enquadramento jurídico, em conformidade com a jurisprudência desta Corte.
No caso em apreço, o fornecimento de energia elétrica a edificações irregulares em geral foi autorizado pela Lei Municipal nº 2.070/2018 de SãoFrancisco do Sul, que dispõe:
“Art. 1º Ficam permitidas as ligações de energia elétrica pela concessionária da rede pública, Centrais Elétricas de Santa Catarina S.A. – CELESC, nas edificações que não tenham o competente alvará de construção e/ou habite-se fornecido pela Prefeitura Municipal de SãoFrancisco do Sul, desde que: 
I – a edificação não esteja localizada em Área de Preservação Permanente – APP, exceto se comprovada que se trata de área urbana ou rural consolidada, com comprovação fotográfica com data anterior a esta Lei. 
II – a edificação não esteja localizada em área classificada pela Defesa Civil como de risco alto, risco muito alto ou de exclusão; 
III – a edificação esteja cadastrada na Prefeitura para a cobrança de Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU, ou possua fatura de água, ou inscrição no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA. 
IV – respeitem as regras estabelecidas pela concessionária.
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”
Como se vê, a lei em alusão admite a prestação do serviço inclusive a edificações situadas em área de preservação permanente, desde que se comprove, por meio de fotografias, a inserção em área urbana ou rural consolidada. 
Mencione-se ainda que a lei sequer estabelece parâmetros para se aferir a caracterização de área urbana ou rural consolidada, permitindo, assim, larga margem de discricionariedade à Administração.
Importa ressaltar que a norma municipal em questão contraria o disposto no art. 52 da Resolução nº 414/2010 da Aneel, que preceitua:
“Art. 52. A distribuidora pode atender, em caráter provisório, unidades consumidoras de caráter não permanente localizadas em sua área de concessão, sendo o atendimento condicionado à solicitação expressa do interessado e à disponibilidade de energia e potência.
[…]
§ 2º Para o atendimento de unidades consumidoras localizadas em assentamentos irregulares ocupados predominantemente por população de baixa renda, devem ser observadas as condições a seguir: (Redação dada pela REN ANEEL 479, de 03.04.2012) 
I – deve ser realizado como forma de reduzir o risco de danos e acidentes a pessoas, bens ou instalações do sistema elétrico e de combater o uso irregular da energia elétrica; 
II – a distribuidora executará as obras às suas expensas, ressalvado o disposto no § 8° do art. 47, devendo, preferencialmente, disponibilizar aos consumidores opções de padrões de entrada de energia de baixo custo e de fácil instalação; 
III – a distribuidora pode adotar soluções técnicas ou comerciais alternativas, mediante apresentação das devidas justificativas para avaliação e autorização prévia da ANEEL; e (Redação dada pela REN ANEEL 610, de 01.04.2014) 
IV – existência de solicitação ou anuência expressa do poder público competente. (Incluído pela REN ANEEL 418, de 23.11.2010) 
§ 3º Os consumidores atendidos na forma deste artigo devem ser previamente notificados, de forma escrita, do caráter provisório do atendimento e das condições técnicas e comerciais pertinentes, bem como da possibilidade de conversão do atendimento provisório em definitivo nos termos do §5o e, no caso do § 2o , da eventual necessidade de remoção da rede de distribuição de energia elétrica após a decisão final sobre a situação do assentamento. (Redação dada pela REN ANEEL 670 de 14.07.2015) 
§ 4º Os equipamentos de medição a serem instalados devem ser compatíveis com a aferição e o registro das grandezas de consumo de energia elétrica e demanda de potência, conforme o caso. 
§ 5º O interessado poderá solicitar a conversão do fornecimento provisório em definitivo, devendo a distribuidora verificar a necessidade de restituir valores pagos a maior, aplicando os procedimentos descritos nos arts. 40 a 48, conforme o caso, no prazo de até 90 (noventa) dias da solicitação, com a devida atualização pelo IGP-M, considerando o orçamento à época, a carga, demanda e tarifas atuais, bem como a necessidade de obra adicional, custos de retirada não incorridos e aproveitamento da obra já realizada no atendimento provisório. (Incluído pela REN ANEEL 670 de 14.07.2015)”
Observa-se, assim, que a possibilidade de fornecimento de energia elétrica a assentamentos irregulares possui disciplina federal mais restritiva do que aquela concedida pela Lei Municipal nº 2.070/2018 de SãoFrancisco do Sul.
Logo, emerge a plausibilidade das alegações do Ministério Público a justificar a concessão da tutela de urgência.
Ademais, embora a parte agravante discorra sobre os fundamentos de direito que ensejariam a reforma da decisão, não demonstra a existência de risco ao resultado útil do processo ou o perigo de dano inverso (periculum in mora inverso) a impedir a concessão da tutela liminar. Sobre a presença do requisito da urgência, transcreve-se o seguinte trecho das razões recursais:
“O fundado receio de dano irreparável, por sua vez, consiste no prejuízo dos que dependem da ligação de energia elétrica e que, poderiam recebê-la caso os imóveis estejam localizados em locais em que comprovadamente esteja mitigada faticamente a proteção ambiental.”
A alegação em destaque não revela perigo de dano inverso capaz de justificar a cassação da tutela concedida em favor do Ministério Público. Com efeito, a parte agravante não demonstrou a existência de situações concretas em que o direito à moradia de seus titulares poderá perecer caso a tutela não seja imediatamente concedida, possibilitando a ligação de energia elétrica a imóvel irregular. Isto é, não comprovou risco de dano iminente! 
Para além disso, emana das alegações ministeriais a existência de perigo de dano. Uma vez efetivada a ligação de imóveis irregulares à rede de energia elétrica, tornar-se-á possível habitá-los, contribuindo, assim, para a consolidação de ocupações que desrespeitam normas urbanísticas e ambientais, circunstância que dificultaria ou até mesmo inviabilizaria a reversão da situação de fato.  
Desse modo, o perigo da demora ou risco ao resultado útil do processo milita em favor da tese ministerial, justificando a concessão da tutela de urgência.
Nesse contexto, escorreita a decisão agravada ao deferir a tutela de urgência postulada pelo Ministério Público na origem.
Ante o exposto, voto por conhecer do agravo por instrumento e negar-lhe provimento.

Documento eletrônico assinado por CARLOS ADILSON SILVA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1058532v15 e do código CRC aa847100.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CARLOS ADILSON SILVAData e Hora: 20/7/2021, às 18:57:14

Agravo de Instrumento Nº 5046429-96.2020.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA

AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE SÃOFRANCISCO DO SUL/SC AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

EMENTA

AGRAVO POR INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EM FACE DO MUNICÍPIO DE SÃOFRANCISCO DO SUL. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA A EDIFICAÇÕES IRREGULARES. TUTELA DE URGÊNCIA. DECISÃO QUE DEFERIU REQUERIMENTO LIMINAR A FIM DE IMPEDIR NOVAS LIGAÇÕES DE ENERGIA ELÉTRICA SEM APRESENTAÇÃO DE ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO OU HABITE-SE. 
INSURGÊNCIA DA PARTE RÉ. PRELIMINAR. AVENTADA INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE NORMA MUNICIPAL, FORMULADO EM CARÁTER INCIDENTAL. CAUSA DE PEDIR. CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE. POSSIBILIDADE EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PREFACIAL REJEITADA.
“De acordo com a jurisprudência desta Corte, ‘a inconstitucionalidade de determinada lei pode ser alegada em ação civil pública, desde que a título de causa de pedir – e não de pedido -‘, como no caso em análise, pois, nessa hipótese, o controle de constitucionalidade terá caráter incidental (REsp 1.569.401/CE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/03/2016, DJe 15/03/2016).” (STJ, AgInt no REsp 1.345.995/RS, rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, j. 23/09/2019)
MÉRITO. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA A EDIFICAÇÕES IRREGULARES AUTORIZADO PELA LEI MUNICIPAL Nº 2.070/2018. QUESTÃO REGULADA DE FORMA MAIS RESTRITIVA PELO ART. 52 DA RESOLUÇÃO Nº 414/2010 DA ANEEL. PLAUSIBILIDADE DAS ALEGAÇÕES CARACTERIZADA. RISCO, ADEMAIS, DE CONSOLIDAÇÃO DE OCUPAÇÕES ILEGAIS. PERIGO DE DANO IRREVERSÍVEL. ACERTO DA DECISÃO AGRAVADA AO DEFERIR O PROVIMENTO LIMINAR. 
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, conhecer do agravo por instrumento e negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 20 de julho de 2021.

Documento eletrônico assinado por CARLOS ADILSON SILVA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1058533v11 e do código CRC e195e7eb.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CARLOS ADILSON SILVAData e Hora: 20/7/2021, às 18:57:14

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 20/07/2021

Agravo de Instrumento Nº 5046429-96.2020.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA

PRESIDENTE: Desembargador FRANCISCO JOSÉ RODRIGUES DE OLIVEIRA NETO

PROCURADOR(A): BASILIO ELIAS DE CARO
AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE SÃOFRANCISCO DO SUL/SC AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual do dia 20/07/2021, na sequência 113, disponibilizada no DJe de 05/07/2021.
Certifico que o(a) 2ª Câmara de Direito Público, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO AGRAVO POR INSTRUMENTO E NEGAR-LHE PROVIMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA
Votante: Desembargador CARLOS ADILSON SILVAVotante: Desembargador FRANCISCO JOSÉ RODRIGUES DE OLIVEIRA NETOVotante: Desembargador SÉRGIO ROBERTO BAASCH LUZ
JOAO BATISTA DOS SANTOSSecretário

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