É possível usucapião de área inferior ao módulo municipal. Não é porque a área de imóvel é inferior ao módulo estabelecido em lei municipal, que a ação de usucapião extraordinária deve ser julgada improcedente.
O que é usucapião
A usucapião é uma forma de aquisição da propriedade de bens móveis ou imóveis, sendo bastante comum a sua utilização para a regularização da propriedade imobiliária.
Existem várias modalidades de usucapião contando cada uma delas com requisitos específicos, no entanto, todas, sem exceção, exigem o exercício da posse durante um determinado período de tempo.
Além do exercício da posse, um outro requisito comum para a usucapião, é que a coisa seja hábil ou suscetível de ser usucapida.
Por exemplo, a propriedade de bens fora do comércio e de bens públicos, não são passíveis de aquisição pela usucapião.
O que é módulo municipal
Cabe aos Municípios levar a efeito uma política de desenvolvimento e expansão urbana, ordenando a cidade, sobretudo, dividindo-a em áreas com diretrizes diferenciadas para ocupação e uso do solo.
O módulo municipal é a área mínima de ocupação do solo prevista na legislação municipal, servindo, por exemplo, como parâmetro para aprovação de loteamentos.
É possível usucapião de área inferior ao módulo municipal
Uma controvérsia que já se encontra pacificada no Poder Judiciário, é a possibilidade de usucapião de área inferior ao módulo municipal.
Como visto acima, um requisito previsto em todas as modalidades de usucapião, é que a coisa (móvel ou imóvel), cuja propriedade se pretende adquirir, seja hábil ou suscetível de ser usucapida.
Tendo em vista as leis municipais, através do módulo municipal, limitarem a ocupação do solo estabelecendo, assim, um medida mínima para lotes urbanos, chegou-se a pensar que áreas inferiores ao módulo municipal não seriam possíveis de serem regularizadas por intermédio da usucapião.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), no entanto, já decidiu que, independentemente do tamanho do módulo municipal, é possível a usucapião desses imóveis.
STJ decide ser possível usucapião de área inferior ao módulo municipal
A Segunda Seção do STJ, em julgamento sob o rito de recurso repetitivo (Tema 985), fixou o entendimento de que a usucapião extraordinária não pode ser impedida em razão de a área discutida no processo ser inferior ao módulo estabelecido em lei municipal.
Para chegar a essa decisão, o STJ levou em consideração, sobretudo, precedente do Supremo Tribunal Federal no RE 422.349, que julgou ser bastante o preenchimento dos requisitos do artigo 183 da Constituição para o direito à usucapião especial urbana.
Veja, a seguir, trecho de julgamento do Supremo Tribunal Federal, o qual o STJ se baseou para julgar viável a usucapião de área inferior ao módulo municipal:
(…) preenchidos os requisitos do art. 183 da CF, o reconhecimento do direito à usucapião especial urbana não pode ser obstado por legislação infraconstitucional que estabeleça módulos urbanos na respectiva área em que situado o imóvel (dimensão do lote). [RE 422.349, rel. min. Dias Toffoli, j. 29-4-2015, P, DJE de 5-8-2015, Tema 815, com mérito julgado.]
Supremo Tribunal Federal, RE 422.349
Assim, tanto STJ, como STF, tem o entendimento bem definido quanto a não haver qualquer empecilho a usucapião de áreas com medidas inferiores ao módulo municipal.
Agora, já que você chegou até aqui, fique por dentro da modalidade de usucapião denominada de usucapião extraordinária, principalmente, por ser o ponto de partida para a análise do tempo necessário para regularização de uma propriedade por intermédio da usucapião.
O que é usucapião extraordinária
O tempo do exercício de posse sobre o imóvel é um requisito comum a todas as modalidades de usucapião.
Fatores como as características do imóvel, a sua destinação e a existência ou não documentos, por exemplo, influenciam no prazo exigível para a ação de usucapião.
Assim, para facilitar a análise do que será necessário providenciar para ingressar com a ação de usucapião, o ideal é partir do maior prazo de posse que a lei exige e, depois, verificar se é possível a sua redução, conforme a realidade do seu imóvel.
Dito isso, o maior prazo exigido pela lei para a usucapião de um bem imóvel é de 15 anos, sendo esta modalidade de usucapião denominada de usucapião extraordinária.
O artigo 1.238, do Código Civil, dispõe sobre a usucapião extraordinária:
Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Código Civil
A modalidade denominada de usucapião extraordinária certamente é o meio mais corriqueiro de aquisição da propriedade de um bem imóvel.
Sua característica principal é ser dispensado o interessado apresentar em juízo um justo título, bem como, demonstrar o exercício de uma posse de boa fé.
De acordo com o Código Civil, havendo prova inequívoca de exercício de posse ininterrupta do bem pela prazo de 15 anos, e sendo dita posse exercida de forma mansa e pacífica com ânimo de proprietário, restará configurada a usucapião extraordinária e, por consequência, a aquisição da propriedade imobiliária.
Redução para 10 anos do prazo para usucapião extraordinária
Mas digamos que a posse sobre o imóvel é inferior a 15 anos. Mesmo assim, é possível a usucapião extraordinária. Vejamos então o que diz o parágrafo único do art. 1.238, do Código Civil:
O prazo estabelecido neste artigo [15 anos] reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.”
Código Civil
Veja que, o Código prevê uma redução de 5 anos, passando a ser de 10 anos o prazo da posse na usucapião extraordinária, no caso do interessado ter no imóvel a sua moradia habitual ou, ainda que não morando no imóvel, ter nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
Por fim, uma outra boa notícia para quem deseja regularizar a propriedade do imóvel pela usucapião, é que o tempo do exercício de posse dos antecessores pode ser somado ao do possuidor atual para completar o tempo necessário para usucapião de um bem.
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Base legal
Constituição da República
Código Civil
Jurisprudência: usucapião, módulo municipal
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA. REQUISITOS DO ART. 183 DA CF/88 REPRODUZIDOS NO ART. 1.240 DO CC/02. PREENCHIMENTO. PARCELAMENTO DO SOLO URBANO. LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. ÁREA INFERIOR. IRRELEVÂNCIA. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DECLARATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. JULGAMENTO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. REPERCUSSÃO GERAL. RE 422.349/RS. MÁXIMA EFICÁCIA DA NORMA CONSTITUCIONAL.
1. Cuida-se de ação de usucapião especial urbana em que a autora pretende usucapir imóvel com área de 35,49 m².
2. Pedido declaratório indeferido pelas instâncias ordinárias sob o fundamento de que o imóvel usucapiendo apresenta metragem inferior à estabelecida na legislação infraconstitucional que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano e nos planos diretores municipais.
3. O Supremo Tribunal Federal, nos autos do RE nº 422.349/RS, após reconhecer a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, fixou a tese de que, preenchidos os requisitos do artigo 183 da Constituição Federal, cuja norma está reproduzida no art. 1.240 do Código Civil, o reconhecimento do direito à usucapião especial urbana não pode ser obstado por legislação infraconstitucional que estabeleça módulos urbanos na respectiva área em que situado o imóvel (dimensão do lote).
4. Recurso especial provido. (REsp 1.360.017/RJ, rel. ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª turma, julgado em 5/5/16, DJe 27/5/16) [g.n.]